(Reuters)
Parte da interrupção
festiva de Natal foi aproveitada para recuperar algumas leituras atrasadas,
designadamente sobre os movimentos OCCUPY. A leitura do vasto material jornalístico
que foi publicado sobre os principais movimentos (Londres e Nova Iorque)
constitui uma rara oportunidade não só para compreender os públicos envolvidos
no movimento, mas sobretudo para tomar contacto com histórias de vida de
fragilidade, de atipicidade, de posicionamentos e regimes precários do ponto
vista do acesso, permanência e marginalização face ao mercado de trabalho.
A imersão neste
conjunto de histórias de vida proporciona uma situação de forte desconforto
relativamente à incapacidade do pensamento económico corrente internalizar
estas situações de atipicidade face ao mercado de trabalho. A comparação entre
os movimentos de Londres e Nova Iorque, ambos focados nos desvarios do sistema
financeiro, confirma ainda a profunda complexidade dos mercados de trabalho
inglês e americano do ponto de vista dessas situações de atipicidade nas relações
de trabalho.
A New Yorker
de 5 de Dezembro de 2011, versão impressa, publica uma comovente reportagem centrada
no OCCUPY WALL STREET. O título e particularmente o sub-título do artigo
(George Packer) são apelativos: “Todas as pessoas iradas – um homem sem
trabalho encontra o espírito de comunidade no OCCUPY WALL STREET”.
Praticamente toda
a reportagem é construída sobre a história de vida de Ray Kachel. Daí o título
deste post. Kachel é um homem de todos os ofícios informáticos, nascido e a
trabalhar em Seattle, com uma trajectória anti-social comum a muitos indivíduos
que labutam no sector da economia da informação. O impacto da grande recessão
de 2008/09 no mercado tecnológico de Seattle leva-o a um processo de precarização
progressiva e de delapidação progressiva do seu reduzido património de
poupança, incluindo todos os seus gadgets informáticos, alguns deles instrumentos
do seu próprio trabalho.
A história da
reportagem foca-se na sua crescente atenção à informação proveniente do OCCUPY
ALL STREET e à sua progressiva identificação com o movimento, que o levaram
algures numa noite de Outubro a instalar-se no Zuccotti Park (Liberty Square). Pelos olhos
interpostos de Kachel, a reportagem fornece uma visão impressiva e riquíssima
das condições de ocupação até à ocupação militarizada do espaço ocupado. Kachel
redescobre o sentido de comunidade mas experimenta também as dificuldades de
participação activa no processo de ocupação.
O fim da
reportagem é arrepiante. Tendo escapado à ocupação militarizada e
desmantelamento do acampamento, algures num banco perto da ponte de Brooklyn,
tenta, em vão, no Tweeter obter alguma informação sobre o que iria passar-se após a
desocupação. Embora determinado a retomar o contacto com o processo que o
aproximou de novo de um sentido colectivo, um pensamento domina aquele seu momento
de repouso: estava só, era um sem-abrigo em Nova
Iorque.
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