Não faço a mínima ideia se o Deputado do PS Pedro Nuno
Santos aspirou de facto ao seu momento de prime time com a sua diatribe
rapidamente capturada por uma rádio local. Talvez uma Assembleia local menos
motivada tenha determinado o arrebatamento do “Não pagamos, não pagamos”, que é
uma palavra de ordem que poderia ter perfeitamente substituído o “estou-me
marimbando para os credores”.
Mas se foi ou não um acto premeditado é o que menos
importa. As sucessivas justificações que o próprio Deputado foi deixando ao
longo dos dias seguintes são mais intrigantes. Pelos vistos, lendo afirmações
do próprio, o objectivo seria colocar no centro da discussão a reivindicação de
uma agenda de crescimento para a Europa, forçando essa perspectiva através de
uma estratégia negocial em que a possibilidade de não pagar é a “única” (opinião
do Deputado) arma ao alcance de um país devedor, pequeno, o que não é
despiciendo, acrescento eu.
Há que convir que se trata de uma forma muito pouco canónica
e algo obtusa de colocar no centro da discussão a Agenda de Crescimento para a
Europa, sem a qual a terapia da austeridade vai enredar-se nas suas próprias
contradições. E Manuel Alegre rapidamente se juntou ao sentido trágico do evento
com algo de semelhante a isto: ‘Jovem Pedro, estou contigo, precisamos de
gritos de alma desta natureza, não capitularemos’.
Estes eventos valem o que valem. Mas o que parece estar
aqui em questão é a profunda incapacidade do PS definir uma linha de rumo para
uma governação alternativa, criando condições para que o mito da austeridade
expansionista dê lugar a soluções de política económica e monetária mais
globais e consistentes. O que não é exactamente o mesmo que trilhar o espaço da
não governação, sempre mais fácil de explorar. Dificilmente, essa linha de rumo
para uma governação alternativa poderá emergir sem uma profunda e meticulosa
explicação do último período de governação socialista e da vertigem do
incremento da dívida que precipitou o descalabro. Procurar objectivamente essa
explicação será a única via de libertar a má consciência com que têm partido
para a discussão da situação actual. Por exemplo, seguir essa linha não será
por exemplo assobiar para o ar e procurar descontextualizar as afirmações de Sócrates
em Paris. Será pelo contrário partir dessas afirmações, tomá-las a sério e
enfrentar o debate. O artigo de Miguel Sousa Tavares no Expresso de hoje sobre
as declarações de Paris são curiosamente um bom modelo do que é tomar a sério
essas declarações e questionar o que se passou.
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