terça-feira, 20 de dezembro de 2011
VOICE: Berros ou Afinação?
Um tema caro para quem se interessa por desenvolvimento urbano e regional é o da mudança institucional. Sendo um fenómeno naturalmente complexo, uma entrada possível passa por perceber de que maneira actores interessados no desenvolvimento local – mas com abordagens que desafiam o status quo – intervêm em processos de decisão, alterando ou não discursos, normas e rotinas instaladas em organizações com mandato de planeamento. Um dos trabalhos seminais de Albert O. Hirschman – autor que inspira a linha editorial deste blogue – parece sugerir-nos que tal poderá estar relacionado com a capacidade de tais actores fazerem ouvir a sua voz (VOICE) no sentido de alterar tais instituições. Todavia, não parece interessar tanto quem berra mais alto mas quem consegue afinar a sua intervenção no sentido de um efectivo diálogo compreensível pelas partes – só assim essa voz pode ser suficientemente amplificada no sentido de provocar mudança.
Não sendo uma tese estranha à teoria contemporânea do planeamento, tive oportunidade de reflectir recentemente sobre o poder desta noção ao contactar localmente com as alterações institucionais e organizativas em curso no Rio de Janeiro, em contexto de preparação do legado social dos mega-eventos desportivos que se aproximam. É uma evidência que o modelo de planeamento de cidade que está directamente associado a estes eventos – e.g. desenvolvimento de vilas olímpicas – é de matriz marcadamente neo-liberal, baseado em visões de cidade global, associadas a projectos imobiliários especulativos e privilégios privados que poderão facilmente contribuir para acentuar desigualdades sócio-espaciais numa das cidades já mais desiguais do mundo. As contra-reacções de denúncia radical do modelo têm emitido berros em todas direcções, mas com audição marginal e impacto nulo na mudança do modelo em causa.
Em oposição, as abordagens que têm permitido introduzir nuances sociais significativas no modelo de legado (e.g. desconcentração espacial dos investimentos, pacificação-integração urbana de favelas e foco na melhoria da mobilidade urbana) têm surgido por via de vozes não menos críticas mas que tentam provocar a mudança a partir do seu interior. Não recusando a base do modelo sem produzir sugestões concretas e concretizáveis, a acção e influência do Observatório de Favelas (http://www.observatoriodefavelas.org.br) nos órgãos de decisão da cidade têm contribuído para a emergência de discursos mais moderados e novas rotinas de planeamento que introduzem as questões sociais de forma vincada na equação do crescimento e desenvolvimento urbano.
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Vejamos se da gritaria de parte a parte surge um modelo intermédio... e se quem grita baixinho é suficientemente persistente para se fazer ouvir.
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