(Desde há pelo menos três anos somos bombardeados pelo
tema da transformação digital. Tal como noutras “revoluções” tecnológicas as
trajetórias de desenvolvimento tecnológico nem sempre são rápidas, algumas das
quais necessitando de longos períodos de maturação. Essa longa maturação suscita frequentemente dúvidas sobre a real valia das
transformações anunciadas.
Dirá o senso comum que se a transformação demora tanto tempo a maturar alguma
razão haverá para esse lento despertar, talvez a não valia intrínseca do que se
anuncia como transformador. E não apenas o senso comum. Tenho por detrás das
costas, na minha estante, várias obras que avançam com suspeição relativamente
fundada sobre o potencial de crescimento da transformação digital quando
comparada com outras épocas de progresso tecnológico e crescimento económico. Mas,
por vezes, a “história” acelera e também nem sempre por razões de proximidade à
tecnologia.
O gráfico elaborado pela equipa da McKinsey e que abre este post é
revelador de uma dessas acelerações citadas na introdução. Ele reporta à
economia americana e por isso estará eventualmente à frente relativamente a
outras acelerações similares ocorridas pelo mundo desenvolvido. Mas estou seguro
que encontraremos fenómenos da mesma magnitude noutros países e inclusivamente
em Portugal.
As plataformas de comércio/negócio eletrónico foram-nos sempre apresentadas
como uma das transformações mais relevantes que a mudança digital poderia gerar
nos modelos de negócio empresarial. Mas o que releva é que, por força imperiosa
da pandemia, em três meses se assistiu a uma progressão equivalente à registada
nos dez anos anteriores. É, de facto, uma aceleração prodigiosa e obviamente
que nos interrogamos se se trata de um choque induzido por uma força exógena
que tenderá a esbater os seus efeitos ou se, pelo contrário, os três meses do
gráfico anunciam um outro paradigma irreversível e que transformará transversalmente
e de vez os modelos de negócio empresariais.
A indeterminação estrutural que a pandemia instalou não permite uma
resposta sem riscos a essa interrogação, mas parece crível que o crescimento da
digitalização nos modelos de negócio partirá de um outro patamar. Ora, olhando
para o passado, compreende-se que esse salto disruptivo entre os dois patamares
só poderia ser introduzido por um fator exógeno desta envergadura.
Mas, neste caso, o salto disruptivo acontece numa transformação que estava
desenhada há já algum tempo. Vale a pena interrogar se não estarão
ocultas aos nossos olhos outras transformações disruptivas suscitadas pelo
mesmo processo pandémico. Será que, por exemplo, as tendências de procura
turística não vão experienciar o embate de transformações disruptivas
profundas, gerando novos patamares para baixo (por exemplo, o turismo de massa),
mas também para cima (por exemplo o turismo natureza e de maior fruição do
território), acelerando também mudanças que eram mais desejos do que efetivas
disrupções? E o universo das relações casa-trabalho não poderá também evoluir
segundo padrões disruptivos?
Para um país como Portugal que tem evoluído essencialmente segundo padrões
de inovação incremental, o que representará para nós este tipo de disrupções?
Uma ameaça ou uma oportunidade de conseguirmos também evoluir a partir de
outros patamares?
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