(Lentamente, muito lentamente, a Cidade retoma os
biorritmos de antes, com os primeiros grupos de turistas a evidenciar a sua
presença. A manhã estava linda e por isso não resisti aos afetos da esplanada e
das recordações do Piolho. Temo no entanto que a
Cidade não resista economicamente a este meio-termo.
Havia uma razão forte para que a manhã livre das sextas feiras deste vosso
amigo em rota acelerada para o envelhecimento ativo fosse ocupada com o
regresso à Cidade pelas bandas do Carmo, Carlos Alberto, Cordoaria, Clérigos e
imediações. Afinal, a companheira tinha mostrado a sua habilidade no corte de
cabelo caseiro em pleno confinamento, felizmente ainda abundante, mas era hora
de acertar pontas e retomar o toque dos profissionais da Invicta, impecavelmente
adaptada às exigências da segurança sanitária.
É um ritual com memórias afetivas de usufruição das atmosferas e espaços
públicos desta zona da Cidade, não deixando de ser curioso que o mesmo acontece
com o meu colega de blogue, embora mais para os lados de Cedofeita e dos seus
símbolos. É verdade que alguns ícones expressivos desta zona da Cidade já se perderam
na voracidade do tempo e das suas inexoráveis mudanças no tecido urbano (recordo-vos
que não sou um saudosista do espaço urbano, antes o compreendo como em
permanente mudança). Basta recordar a livraria Leitura, a Invicta (confeitaria
porque a barbearia resiste orgulhosa), a barbearia Fernandes (mesmo em frente à
igreja do Carmo, onde conheci o comunista barbeiro mais generoso, o Sr. Salvador
que me cortou o cabelo desde menino) e outros que tais.
Gosto muito de seguir o biorritmo das Cidades que nos são afetivamente mais
próximas, assistir ao acordar faseado no tempo das suas principais personagens
e por isso estava curioso para, a partir da esplanada do Piolho (sim porque
espaços públicos fechados ainda me metem alguma confusão), gozar uns minutos de
distensão e observar os biorritmos do desconfinamento possível.
Uma evidência clara a esta hora ainda matutina, numa manhã deslumbrante e
que nos coloca de bem com a vida (para os que são capazes disso), é o regresso
tímido mas visível dos turistas. Claro que a Lello ainda goza de sossego, mas a
sua presença já não pode ser ignorada. Tenho sinais a outros níveis de que esse
movimento existe. Amigos com alojamentos locais pelas bandas do Carregal e
também de S. Lázaro anunciam-me que os têm já ocupados, curiosamente com habitués,
ou seja de gente que regressa à Cidade porque se entrosou com as suas dinâmicas
e atmosferas.
Estou convicto que este meio-termo se vai manter por algum tempo. É um
panorama agradável para a usufruição distendida e segura do espaço público, mas
temo que, do ponto de vista económico, a base que brotou por força do impulso
turístico não aguente muito tempo este meio-termo. Os economistas falam a este
respeito de indivisibilidades. Ou seja, o impulso turístico gerou investimento
e uma dose de capital fixo que não se compadece por muito tempo com o meio gás.
Isto tem óbvias relações com o tipo de recuperação económica que vamos ter, se
em V abrupto com recuperação rápida ou se num U muito alargado e com
recuperação muito lenta, senão intermitente. Mas isso vai se r tema de um próximo
post.
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