quarta-feira, 17 de agosto de 2016

ÁREAS METROPOLITANAS




(Agora que tudo indica que fiquemos limitados ao bronze de Telma e que nem a entrada do Pontal parece ter animado a cena política, é altura de repegar alguns temas que aguardavam, pacientemente, análise e comentário)

A bipolaridade portuguesa é conhecida, oscilamos vertiginosamente entre a euforia dos resultados aparentemente impossíveis e a precipitação no abismo depressivo da desgraça. O desporto como manifestação reativa de massas preenche muito este modelo. Projetámos assim uma participação olímpica que apontava para um número de medalhas desproporcional face ao nosso nível de desenvolvimento e de aposta coletiva desportiva e temos dificuldade de conviver com a frustração. Regra geral, esta dificuldade de conviver com a frustração dos resultados traz também uma outra propensão nacional, a da invocação da culpa exógena, ou seja a invocação de causas para além de um mau momento ou simplesmente da incapacidade. Assim foi com um atleta de eleição como é o canoísta Fernando Pimenta, que arrancou célere para a medalha de ouro mas que devido a uma nova causa externa do infortúnio nacional, as algas e as folhas da lagoa, se quedou pelo quinto lugar. O sexto lugar de Nélson Évora não teve causas externas e quando é assim o equilíbrio está alcançado, nem precisamos de euforia descontrolada nem de frustração na derrota. Por isso, tive a intuição que a medalha de Telma iria ser simbólica.

A outro nível, a modorra política está instalada e nem um impreparado Passos Coelho de tosco improviso animou as hostes. Sabemos apenas que BPN e BANIF já vão para lá dos cinco mil milhões de euros de sucção de fundos públicos e ainda há para aí uns maduros preocupados com a “espanholização” da banca. Quais carpideiras militantes, o que lhes vai na alma é seguramente a perceção de que com a espanholização da banca mais difícil será capturar os interesses financeiros dessa banca. Como cidadão médio que sempre olhou a banca apenas como fonte predominante de aplicação de poupanças em produtos o mais rotineiros possível, o que me preocupa é a “portuguesização” da banca.

Com esta modorra política, é preciso explorar o conjunto dos temas pendentes para encontrar algo de atrativo no comentário.

A descentralização é seguramente um desses temas.

Já qui referi que nas condições estruturais de crescimento anémico em que nos encontramos não me parece haver condições políticas favoráveis para interessar ativamente a população portuguesa numa abordagem da descentralização que se transformasse na verdadeira raiz da reforma do estado. Talvez com boa vontade apontemos a exceção do Algarve, mas a nível regional continuam a campear processos de profunda atomização no Norte, Centro e Alentejo e a região de Lisboa continua com o problema sério resolver de adequação da organização para efeito de Fundos Estruturais com as questões político-administrativas e de relacionamento com a máquina do Estado. Não estou sinceramente a imaginar o que seria um programa eleitoral para uma regionalização nas condições atuais, sobretudo do ponto de vista de qual seria o contributo desse processo para a resolução do problema central “crescimento anémico – alto nível de dívida pública”.

Por isso, foi com curiosidade que tomei nota do modo como o programa do PS abordou esta questão. Dois aspetos suscitaram a minha atenção. Primeiro, a municipalização da eleição dos Presidentes das CCDR. Segundo, a eventual eleição direta dos Presidentes das Áreas Metropolitanas. Duas propostas claras, independentemente do seu valor intrínseco, e falar claro é sempre uma vantagem em temas em que muitos se encolhem escondidos nos interesses que por sobrevivência têm de defender.

Já aqui referi que a municipalização da eleição dos Presidentes das CCDR é má ideia. As CCDR não precisam de respaldo municipal, para isso já existem as CIM (Comunidades Intermunicipais) que podem ser valorizadas se autarcas e Governo o pretenderem efetivamente e a Associação Nacional de Municípios. Esse respaldo não vai assegurar uma legitimidade democrática efetiva. As CCDR precisam é de reforço do seu poder (hoje praticamente inexistente) de coordenação setorial e isso não se consegue com respaldo municipal. Não entendo o que leva António Costa e Eduardo Cabrita a perseguirem esta solução, sobretudo porque não vejo o Governo a definir uma quadro claro de territorialização de políticas públicas envolvendo as CIM.

A eleição direta dos Presidentes das Áreas Metropolitanas sempre a olhei com outro interesse, embora, sobretudo a Norte, a composição da Área Metropolitana do Porto (AMP) seja manifestamente excessiva e dificulte a definição de temas efetivamente metropolitanos para suscitar um debate eleitoral atrativo e uma forte participação população na discussão desses temas. Não tenho aqui dúvida de que seria possível e de grande alcance a definição de agendas políticas metropolitanas tocando efetivamente as condições de vida dos cidadãos metropolitanos que continuam a não ter espaço de intervenção política em temas que não são municipais nem regionais. Mas claramente metropolitanos. Já o escrevi e afirmei-o em público com clareza que tal processo representaria um efetivo avanço na descentralização.

Pois também como já tinha intuído, vozes importantes se levantaram contra esta possibilidade, pelo que vamos sabendo o presidente Marcelo insurgiu-se contra a possibilidade das Áreas Metropolitanas terem legitimidade democrática e as CCDR não o terem e Rui Moreira (e talvez outros presidentes) também se sentiu beliscado por ter que dialogar e negociar com alguém com uma base de legitimidade democrática claramente superior à sua. Verdade seja dita que Rui Moreira teve a coragem de pedir a eleição por sufrágio direto dos Presidentes das CCDR e isso já é uma posição de coerência que se saúda. Tudo indica que o governo irá meter a violinha no saco quanto a esta matéria e depois não digam que não há razões para estar pessimista quanto a estas matérias.

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