quinta-feira, 29 de agosto de 2024

COMO VAI EVOLUIR O CONFLITO EUA – CHINA?

 

                                                        (Richard Baldwin)

(Sabemos como na sequência da adaptação do ocidente livre aos efeitos da invasão russa da Ucrânia ficou mais clara a vulnerabilidade americana, europeia e principais parceiros à influência chinesa, entretanto classificada pelos principais estrategas como ameaça. Se é verdade que o problema chegou a ser referenciado pela administração de Trump, a ameaça só se tornou mais cristalina em plena adaptação ao novo contexto de guerra na Europa. Entretanto, o modelo económico chinês prosseguia a sua marcha implacável, assente num dirigismo político autoritário e por vezes brutal, o qual supervisiona um modelo económico em que o mercado se combina com a força vinculadora do autoritarismo. Aos olhos dos analistas ocidentais começou, entretanto, a ser visível a encruzilhada em que o modelo económico chinês se encontra. Por um lado, a tentação de tudo conseguir através da força das exportações, cavalgando agressivamente quotas a ocidente e a oriente, pelo menos enquanto os sinais de alerta contra a maléfica influência das exportações chineses nos propósitos de recuperação de alguma intensidade industrial nesses países. Por outro lado, emergia a interpretação de que a subida do rendimento per capita chinês e a ascensão das suas classes médias urbanas impunham uma nova atenção sobre o potencial de desenvolvimento do mercado interno e a necessidade de construir um novo modelo de produção capaz de responder ao consumo potencial dessas classes médias urbanas. Recentemente, a revelação dos efeitos do declínio demográfico chinês, já repetidas vezes tratado neste blogue, e os sinais de crash imobiliário tendem a perturbar esta via alternativa para o desenvolvimento económico chinês. Sabe-se também que às autoridades políticas chineses é difícil abandonar a tentação dos excedentes comerciais externos, já que essa ascensão serve às mil maravilhas o discurso político do PC chinês de expansão pelo mundo.

A partir do momento em que a ameaça chinesa está identificada, várias administrações ensaiaram posicionamentos mais agressivos contra a influência chinesa na tecnologia e nos mercados internos. O destaque vai obviamente para a administração americana, já que como sempre as autoridades europeias irão demorar uma eternidade até estabilizarem uma posição similar.

Queria neste post chamar a atenção para as eleições americanas serão também nesta matéria de importância decisiva, já que nelas se irão confrontar duas posições, uma já claramente definida pelo que se observou no passado e outra, a de Kamala Harris, ainda não suficientemente clara.

A posição de Trump é conhecida desde a sua passagem pelo poder. A sua ideia, peregrina e perigosa, é a de que os EUA poderão sozinhos enfrentar a ameaça chinesa e submetê-la aos interesses americanos. Toda a investigação disponível mostra que essa posição tem mais de fanfarronice do que evidência de suporte. Dado o nível de desenvolvimento tecnológico atingido pela China e o grau de penetração já atingido pelos produtos chineses nos mercados ocidentais, as evidências apontam para que os EUA não sejam capazes de sozinhos combater eficazmente a ameaça. Tudo indica que se Trump ganhasse voltaria a usar a mesma estratégia de só contra todos, o que revela uma péssima leitura do que é hoje a economia mundial.

Espera-se que Kamala Harris tenha sobre esta matéria uma posição mais fundamentada e essa só poderá ser a de construir alianças estratégicas com outros países, incluindo a Europa, mas outros países como a Coreia do Sul, o Japão, Austrália, Canadá, Índia e alguns outros. No número de setembro-outubro da Foreign Affairs, Aaron Friedberg, professor em Princeton assina um artigoStopping the Next China Shock: A Collective Strategy for Countering Beijing’s Mercantilism”, que pode ser uma boa ajuda para a candidata democrata marcar a diferença nessa matéria. Claro que no contexto atual da economia mundial, com riscos de fratura e incremento do protecionismo, urdir alianças estratégicas não é tarefa fácil, sobretudo se não forem acompanhadas de objetivos claros que os eleitorados possam compreender e avaliar as vantagens face ao ímpeto chinês. Mas, ainda que de construção difícil, essas alianças são o que o mundo livre tem de melhor para assegurar uma resposta positiva ao avanço chinês em algumas matérias, como os veículos elétricos, a tecnologia das baterias e a questão-chave dos semicondutores.

 

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