Foi com algum estrondo que, algum tempo atrás, rebentou a bomba de uma alegada fraude com fundos comunitários por parte de Manuel Serrão e Júlio Magalhães (pelo menos). Um estrondo que muitos consideraram despropositado por diversas ordens de razões associadas ao modo de estar daqueles cidadãos em sede de sinais exteriores de riqueza manifestamente estranhos e/ou de atitudes e relacionamentos apontando para uma inequívoca assunção pessoal de os apoios europeus corresponderem a um incontestável direito próprio. E muitos foram os que, de uma ou de outra maneira, pactuaram com esse estado de coisas, sobretudo no que toca a responsáveis políticos ou a altos funcionários de instituições ligadas à gestão dos fundos.
Relembro que, segundo um comunicado do Ministério da Coesão baseado numa análise de 89 pedidos de pagamento e 17335 linhas de despesa, cujo montante declarado para efeitos de cofinanciamento pelos beneficiários/promotor ascende a 72,4 milhões de euros, “existiriam despesas insuficientemente justificadas, nomeadamente as realizadas numa unidade hoteleira na cidade do Porto [era público e notório que Manuel Serrão vivia no Sheraton, o que aconteceu durante oito anos] cujo suporte é feito através de uma lista enviada pela entidade beneficiária, não sendo possível verificar, através das faturas, a identidade dos hóspedes ou o número de pessoas e de noites associadas à estadia”, por um lado, e “foi apresentada uma despesa por um fornecedor, confirmando-se, através do respetivo NIF, que esta era o promotor do projeto (faturação consigo próprio)” ou “foram identificados fornecedores participados por consultores do projeto (com participação acionista direta ou indireta nesses mesmos fornecedores), sem evidência de que as operações entre estas partes tenham sido realizadas em condições de mercado”, por outro. Relembro ainda que a AD&C (Agência de Desenvolvimento e Coesão) realizou, como lhe competia, um inquérito interno ao “sistema” junto das principais entidades públicas diretamente envolvidas na suspeita (Compete, IAPMEI e AICEP), com vista a monitorizar as respetivas ações de controlo e a identificar as falhas que permitiram o uso indevido de fundos.
Ora, é precisamente aqui que reside a minha perplexidade decorrente da notícia publicada pelo jornal “ECO” com o título acima – porque é realmente extraordinário e até insólito que a AICEP (onde está apurado que as respetivas insuficiências de gestão irão obrigar à devolução de 30 milhões de euros de fundos europeus já pagos) tenha agora “criado um grupo de trabalho interno, multidisciplinar, que, na sequência de um trabalho concetual prévio realizado em junho e da análise do relatório final da auditoria em julho, está a elaborar um conjunto de recomendações técnicas, que serão acompanhadas de um plano de implementação, para atualização e reforço de procedimentos, de acordo com as melhores práticas na matéria”. Não é este tipo de decisões que evidenciam um exemplo acabado do Estado gastador e ineficiente de que tanto nos tem falado com grande firmeza crítica, senhor presidente da AICEP e caro Ricardo Arroja?
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