(A terra tremeu a sul, e não foi um abalo qualquer, e por estas terras de Moledo – Caminha a última semana de agosto está claramente mais desanuviada, sugerindo que a sazonalidade que apoquenta estes sítios está cada vez mais acentuada. A praia parece querer compensar os resistentes e os indefetíveis dando um ar da sua graça amena e convidativa, sem que a nortada perturbe o ambiente. Para além do registo deste contexto, debato-me com a escolha do tema para reflexão de hoje e sou conduzido à questão do orçamento. Há algo de estranho nesta obsessão pelo orçamento. Afinal, ele nem foi sequer apresentado, quem o deve fazer, o ministro das Finanças, continua perdido em parte incerta, e é debatido como se todos o conhecêssemos. A questão central continua a ser a do posicionamento da oposição, como se a ordem das coisas estivesse invertida. Afinal, não se sabe em concreto que orçamento se propõe o Governo apresentar e nesse contexto tem-se o desplante de sem dar conhecimento desse propósito carregar sobre o PS e depositar nele o ónus da estabilidade política. Tempos estranhos estes …)
A bem da clarificação das coisas, o Chega, preso na sua armadilha de marcar a qualquer preço a cena mediática, abriu as hostilidades e avançou com o remendo de uma proposta de referendo sobre a imigração que não tem ponta por onde se lhe pegue e que facilitou a vida ao PSD. Se o referendo era visto pelo Chega como contrapartida do seu apoio ao tal orçamento que se desconhece, a coisa está resolvida por esse lado. O PSD, naturalmente, renega esse referendo o que é o mesmo que dizer que não está disponível para qualquer acordo com o Chega e muito menos tendo a imigração como moeda de troca.
Com esta clarificação à direita, toda a cena mediática se voltou para o PS de Pedro Nuno Santos, clamando que os socialistas devem ser responsáveis e deixar passar o orçamento, o tal cujos contornos reais se desconhece. Se isto não é um cheque em branco passado à socapa vou ali e venho, incrédulo e espantado com tanta lata.
Mas tal como Ana Sá Lopes o faz lucidamente hoje no Público, a questão está em saber com que lógica e valores se exige ao PS que aprove um orçamento que se desconhece, não se vislumbrando além disso qualquer aproximação a uma ideia de negociação que a AD pretenda iniciar.
Em tese, perante o clima de agressividade que o Governo e a AD têm associado ao legado dos governos de António Costa, não entendo que razões podem ser invocadas para amarrar o PS a um compromisso moral de conceder mais um ano de governação à AD. Em meu entender, só é legítimo politicamente Pedro Nuno Santos aderir a uma negociação para fazer passar o orçamento se e só se for claramente visível que parte e conteúdo desse orçamento possam ser associados à influência política do PS. Sem que aos olhos do eleitorado seja visível que esse putativo orçamento aprovado com os votos ou a abstenção do PS é francamente melhor do que um orçamento estritamente AD penso que será um suicídio político em direto o risco que Pedro Nuno Santos enfrenta. Ora, pela aragem que se tem sentido, não é possível logicamente antecipar que o PSD esteja para aí virado e que dê mostras efetivas de que vai valorizar a colaboração possível da oposição.
Creio que o papão da instabilidade política não chega para conduzir o PS ao cadafalso. Todos devem expressar a sua quota parte de contribuição para contornar essa instabilidade possível. Chantagear o PS com essa questão equivaleria a um descentramento total dos contributos que todos devem oferecer para superar tal instabilidade.
E tudo começa com o orçamento que o Governo se proporia apresentar. Só nessa base será possível ao PS avaliar a circunstãncia de o poder melhorar visível e claramente aos olhos do eleitorado em contexto de negociação. Tudo o resto são desperdícios de preparativos em abstrato, que o PS deve, em meu entender, liminarmente rejeitar.
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