sábado, 24 de agosto de 2024

OS CUSTOS DA CONCENTRAÇÃO

 

(Nos últimos tempos, com destaque para este mês de agosto, que trouxe hoje a chuva para amenizar os espíritos, têm-se sucedido em catadupa notícias sobre falhas e disfuncionamentos de diversos serviços públicos. São problemas relacionados com professores, que antecipam um início de ano escolar com promessas de alunos sem aulas a algumas disciplinas, são os já triviais problemas de assegurar urgências médicas nos serviços de ginecologia e obstetrícia, são os novos problemas de funcionamento da AIMA, são os ecos em Portugal do já disseminado problema dos excessos do turismo com reflexos nas condições de utilização do espaço público por parte de residentes. Uma análise mais atenta dessas ocorrências mostra que a Área Metropolitana de Lisboa surge quase sempre referenciada como ponto de incidência mais marcante de tais anomalias. Em modo de raciocínio rápido, diremos que isso é o reflexo da distribuição territorial da população. As anomalias de funcionamento serão mais visíveis onde a densidade da presença humana é mais saliente. Mas se optarmos por um modo de raciocínio mais elaborado podemos elaborar um pouco melhor a conclusão e suscitar novas perspetivas de análise. A questão está na relação não linear que existe entre os níveis de concentração da população e as evidências observadas sobre anomalias de funcionamento de serviços públicos.)

Tenho para mim que, dadas as suas condições de dotação de recursos de conhecimento e produtivos, todos os países apresentam uma engenharia de gestão das condições de concentração da sua população e das atividades económicas. Essa capacidade de gestão dos efeitos da concentração não é homogénea entre os países, em parte porque a dotação de recursos de conhecimento e de capacidade de gestão em geral não são igualmente distribuídas entre os países. Mas também porque os recursos de coordenação são eles próprios também escassos e se há atividade extremamente exigente em termos de recursos de coordenação a gestão da concentração da população e de atividades é um exemplo claro.

Ora, olhando de perto a realidade nacional, não é difícil perceber que a capacidade de gestão da concentração em Portugal é baixa, não só porque os recursos de conhecimento são deficientemente orientados para este tipo de aplicações, mas também porque os recursos e a capacidade de coordenação de serviços são ambas reconhecidamente baixas.

Desenvolvendo o raciocínio, conclui-se que Portugal enfrenta custos de concentração para os quais os seus níveis de conhecimento aplicado e de coordenação de recursos são deficientes e incapazes de assegurar à população aí residente o nível de qualidade de serviços que seria possível atingir noutro países mais capacitado para tal.

Em meu entender, é isto que se passa na Área Metropolitana de Lisboa. O nível de concentração de pessoas e de atividades aí instalado não encontra no país a engenharia suficiente e habilitada para tornar os custos dessa concentração mitigáveis. O centralismo português tem raízes históricas profundas que por repetidas vezes analisei neste blogue. O problema é que esse centralismo se traduziu por níveis de concentração territorial de pessoas e de atividades para os quais o país não dispõe de gestão e coordenação suficientes. É que esse mesmo centralismo acabou por gerar uma máquina administrativa em que a cooperação de recursos é uma palavra vã.

Por isso, se estou certo no meu raciocínio, iremos continuar a ter a perceção de que na aglomeração de Lisboa tudo acontece. As externalidades negativas da concentração a que esse centralismo nos conduziu não têm solução visível e continuarão por isso a constituir a evidência mais segura que este caminho não é o desejável.

 

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