segunda-feira, 19 de agosto de 2024

QUESTÕES DE SAÚDE

 

(Se não bastasse o risco de aumento do número de mortes face a períodos homólogos associado às ondas de canícula que se têm sucedido por todo o país, com relevo para o interior do país, a questão da saúde tem-se revelado o quebra de cabeças esperado para o governo de Montenegro. Embora o governo da AD disponha de “melhor imprensa” e de “melhor comunicação social” comparativamente com a que foi dedicada ao último governo de António Costa, tudo indica que a ministra da Saúde tenha sido um erro de casting e que a dimensão estrutural do problema das urgências de obstetrícia tenha sido subestimada. Nessa medida, as expectativas que o próprio Governo colocou no seu plano de exceção foram manifestamente exageradas, produzindo uma situação que assume dimensões mais gravosas do que as enfrentadas pelo SNS em tempos de permanência do anterior CEO. Por isso, qualquer medida que transporte consigo alguma mitigação do problema tem de ser saudada nessa qualidade. Não foram, porém, as medidas anunciadas por Montenegro no Pontal que merecem essa consideração. Vou hoje, nesse sentido, referir-me ao acordo-protocolo celebrado entre o Ministério da Saúde e a Santa casa da Misericórdia do Porto que visa utilizar em condições devidamente orçamentadas o Hospital da Prelada gerido por aquela importante instituição da economia social para acolher utentes das urgências dos Hospitais de Santo António e de S. João considerados não urgentes, aliviando as urgências de tal procura e permitindo assim concentrar os recursos disponíveis nos casos verdadeiramente urgentes.)

Devo confessar que esperei que a colaboração entre a Santa Casa da Misericórdia do Porto e o Ministério da Saúde tivesse acontecido mais cedo. A razão é simples. A liderança da SCMP pertence a uma personalidade de grande importância nas hostes do PSD, o Dr. António Tavares, que é assim uma espécie de “senhor disto tudo” nas áreas associadas da economia social e da saúde. Mesmo em tempos de governos do PS, o líder da SCMP era consultado com regularidade dada a sua grande experiência e conhecimento sobre os temas e também devido à importância da própria instituição. Por isso, sempre foi natural que qualquer nova política fosse avaliada ex-ante pela apreciação daquela instituição. Se era assim com os governos PS seria bastante natural que o governo da AD tirasse partido desse importante ativo institucional. É verdade que o António Tavares teve sempre um alinhamento muito particular no interior do PSD e a sua proximidade a Rui Rio era demasiado conhecida para ser ignorada.

O acordo agora celebrado entre a SCMP e o Ministério tem de ser entendido no quadro de intervenções corretoras de curto prazo e não propriamente no âmbito do propósito de resolver o problema da afluência excessiva às urgências por má informação dos utentes. Como é conhecido há longo tempo só uma ponderada e consistente informação alicerçada sobretudo no papel a desempenhar pelos Centros de Saúde de proximidade pode resolver de vez o problema. Nessa medida, o protocolo agora celebrado e a qualidade da instituição, Hospital da Prelada, dirigida pela SCMP permitirá para já aligeirar o trabalho das duas principais unidades hospitalares da Cidade e assim libertar tempo e recursos para se pensar na solução de longo prazo.

Nem considero que o recurso à SCMP constitua um atentado à integridade do SNS. O serviço hospitalar da Misericórdia é muito antigo e precede o próprio SNS e o seu papel na economia social torna-a um parceiro muito particular. Bem diferente seria o caso em que esse protocolo fosse consumado com grandes grupos hospitalares privados. Posso imaginar um SNS em cooperação consistente com a economia social. Já os acordos com os grupos privados tenderão em meu entender a reforçar estes últimos e a continuar a descapitalizar o SNS em termos de recursos humanos e esse é definitivamente o grande problema do SNS.

 

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