quarta-feira, 26 de abril de 2017

POPULISMOS

(Com a devida vénia ao Understanding Society)


(Parece provocação, mas não é, retomar o tema dos populismos em data comemorativa como a de hoje, mas o tema urge, embora talvez a memória resistente da nossa revolução, cheia de contradições, ajude a compreender a resistência da sociedade portuguesa ao fenómeno, embora na diáspora o alimentemos…)

Daniel Little no Understanding Society (link aqui) introduz apelativamente o problema:

“Parece óbvio que, na primeira ronda das eleições presidenciais em França, precisamos urgentemente de compreender melhor a dinâmica e as causas do populismo radical nas sociedades democráticas. O que é o populismo? Porque é que se manifesta com tanta virulência no momento presente como um movimento político? Que papéis o racismo, a xenofobia, o ressentimento e o medo económico desempenham na facilidade com que cidadãos normais na Europa e na América apoiam candidatos e plataformas populistas radicais?

Revendo algumas obras recentes sobre a matéria, Little destaca que o populismo não é um programa ideológico, mas antes um instrumento oportunista de chegada ao poder, o que torna mais difícil a sua caracterização e, consequentemente, o seu combate. Por isso, é necessário cavar nas manifestações recentes e identificar alguns traços, embora sem a certeza de que constituam padrões definidores, isto é, aplicáveis universalmente em todas as derivas populistas.

Entre tais traços, está o apelo abstrato às pessoas e a revolta virulenta contra as elites, numa espécie de dualismo que se alimenta das relações entre os dois apelos. A revolta contra as elites tem por pressuposto o argumento de que estas usurparam benefícios às pessoas e que por isso se pode conquistar estas últimas com a denúncia violenta das elites. Nem sempre favorecida por uma figura carismática, mas muitas vezes nela alavancada, o dualismo atrás referido teria de ser combatido por uma perspetiva plural: “por via de muitos centros de poder e através de uma via política de compromisso e consenso, refletindo os interesses e os valores de tantos quanto os possíveis grupos diferentes”.

Um programa político alternativo para configurar esta perspetiva plural?

O que a experiência recente nos mostra é que a mediação política para assegurar o tal pluralismo, no qual a diversidade constitui uma forma de resistência, não tem sido de fácil concretização. O populismo alimenta o referido dualismo do apelo às pessoas indiscriminadas e da virulência contra as elites com complementos que podem ir desde a exploração do medo, das preocupações securitárias, ao nacionalismo económico, do medo da estranheza do outro. E essa alimentação tem-se revelado extremamente eficaz, seja ela conseguida por via de lideranças carismáticas, movimentos sociais organizados ou exploração de dinâmicas localistas.

Mas, segundo Daniel Little, continuam questões por responder, sobretudo a explicação das razões pelas quais o ódio e a divisão são tão retribuídos em termos políticos nos tempos que correm.

Se estas análises estão certas uma provável vitória de Macron nas presidenciais francesas, apesar da estupidez histórica da extrema-esquerda, não apagará os sinais que conduziram ao populismo francês. Há um dado do problema que muitos teimam em ignorar. Admitindo que Le Pen consegue chegar aos 40% na segunda volta, então projetando essa dinâmica para as legislativas francesas, a Frente Nacional será seguramente a força política com maior representação parlamentar. Então aí outros demónios se soltarão e o então Presidente Macron vai ter de suar as estopinhas.

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