(A Casa do Castanheiro, uma preciosidade em Vale Flor)
(A psicologia das condições de afluência, como dizia o John Kenneth Galbraith, ou seja, das economias avançadas, entretém-se frequentemente com questões que, à luz dos remediados e desapossados da vida, é muito provavelmente entendido como um preciosismo de endinheirados. Nestes primeiros dias de setembro, tenho deparado na imprensa internacional com alguns artigos que elaboram sobre as razões e como mitigar o fenómeno de eventuais surtos depressivos pós-férias, no chamando regresso ao trabalho, para muita gente enfadonho e não necessariamente aligeirado com as condições de teletrabalho. O que para uma grande maioria dos portugueses deve ser algo estranho ou mesmo gerar situações de desconforto, já que uma elevada percentagem de portugueses não as goza, pelo menos fora de casa. Não é a essa matéria que dedico este post de fim de semana, mas antes a um outro síndrome pós-férias, esse mais real, que se prende com os territórios do interior a braços com o declínio demográfico e com o seu esvaziamento.)
Nos últimos anos, com exceção do ano passado, temos tido o enorme prazer de responder ao convite de uns Amigos de há longo tempo, que partilham amavelmente connosco o ambiente familiar da sua casa em Vale Flor, Mêda, naquela região do país em que não sabemos bem se estamos no Norte ou no Centro (oficialmente a Mêda está na região NUTS II Centro), pois a relação com o Douro Superior é intensa. A rapaziada mais nova da família que nos acolhe, que nos ofereceu ontem ao serão uma divertida “performance” teatral, já designou pela sua regularidade esta semana de “a semana de Vale Flor” e isso é o melhor indicador de que ela faz parte do seu imaginário de férias.
Vale Flor é uma aldeia, como muitas outras, inserida neste território vizinho como a Mêda, Trancoso, Celorico da Beira, Vila Nova de Foz Côa, só para falar nos municípios que mantêm com ela uma mais forte proximidade. Agosto é obviamente um pico de animação simulada, pois casas cada vez maiores e melhor construídas abrem-se naquele mês incompleto para acolher os seus proprietários emigrantes, que num misto de nostalgia e de dever e respeito para com as suas raízes regressam temporariamente e tratar de alguns dos assuntos que esperam resolução. Obviamente que não só as aldeias como Vale Flor, como também as sedes de concelho (Trancoso destaca-se pela sua qualidade urbana) parecem recuperar do adormecimento. Imagino que entre outros argumentos seja esta perceção de contribuir para a recuperação do adormecimento que traz esta gente às suas raízes, nem sempre acompanhadas da sua descendência, pois esta, em muitas situações, já partiu para outra, não ignorando, mas deixando em banho-maria essas raízes.
Nestes primeiros dias de setembro, como o de hoje, num sábado que começa frio, alertando-nos que o outono está próximo, tempo depressivo por natureza, tudo parecer ter regressado ao irreversível normal. As casas cada vez maiores e de melhor construção, algumas delas reabilitadas, estão fechadas, aguardando por um tempo próximo. É a isto que chamo o síndrome pós-férias destes lugares. Outrora, esse síndrome atingia os que permaneciam, em regra os mais velhos, quando grande parte das suas famílias emigrou, era o tempo de novo da separação. Por agora, esse fenómeno é praticamente residual, senão mesmo inexistente em muitas aldeias, simplesmente porque os mais velhos que mantinham esses laços morreram. Era um momento de tristeza, mas ao mesmo tempo de esperança e de espera pelo verão seguinte. Agora é mesmo uma depressão do território.
É verdade que outros territórios mais densos também vivem este síndrome pós-férias, como Caminha onde acabo por passar grande parte do ano. Mas aí o fenómeno chama-se sazonalidade e esta está cada vez mais acesa. Este ano notei já no dia 26 de agosto uma enorme diferença de ocupação. Quer isto dizer que a sazonalidade está cada vez mais concentrada. Já não é a segunda quinzena de agosto, pois na última semana o nível de ocupação já não era o mesmo. Talvez, interpretação benigna, porque os portugueses estão cada vez europeus e começam a trabalhar cada vez mais cedo.
Mas não é o mesmo fenómeno do síndrome pós-férias do interior mais deprimido. No caso dos destinos de férias e de segunda residência é sempre mais fácil tentar mitigar a sua incidência. Acima, deixo-vos a imagem de uma iniciativa que tem lugar em Caminha, na Biblioteca Municipal. No caso de Vale Flor o fenómeno é ainda mais estrutural, irredutível, apesar do relativo êxito da reabilitação aqui ao lado da aldeia de Marialva, uma joia de turismo de habitação neste tipo de paragens.
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