O último cartaz que o “Chega” colocou nas ruas de Portugal é um sinal manifesto do que por aí vai, ou pode tender a surgir, nas cabecinhas de uma parte significativa dos nossos concidadãos. Mais até do que a associação de Montenegro a Sócrates, que tanto incomodou (e compreensivelmente) o primeiro-ministro, a questão marcante está no conteúdo subliminar centralmente visado pela mensagem pretendida: 50 anos de corrupção, leia-se, a Democracia falhou. Depois do “Limpar Portugal” e do “Vamos Fazer o Sistema Tremer”, além de outros outdoors escabrosos com que nos brindou a genialidade de André Ventura, veio agora este e logo de imediato um outro, disfarçadamente manso e a solicitar humildemente “uma oportunidade” perante os falhanços de PS e PSD que duram há 50 anos.
É assim que estamos! E não me enganarei muito, como sinceramente espero que aconteça, se formular o preocupado vaticínio de algum sucesso eleitoral para esta gente... Contra este estado de coisas, de modos diversos mas convergentes no essencial, lá vão aparecendo no espaço público certas vozes respeitáveis (vejam-se abaixo exemplos, como os de Seguro e Carneiro na área socialista, Negrão na social-democrata ou Louçã mais à esquerda). Só que o tempo que vivemos já não se compadece com a mera boa intencionalidade de “bons rapazes” como estes e outros, designadamente porque o discurso que emitem está gasto e/ou ultrapassado como elemento de convencimento para a maioria votante de hoje. Nesta perspetiva, e a meu ver, a questão que se tem de colocar, sob pena de riscos maiores como os acima prenunciados, é a seguinte: existe alguém capaz de abrir um caminho de diálogo ao centro do espetro político que possa fazer caminho, para além do desgaste dos pequenos ódios que ocupam Montenegro e Pedro Nuno?
Seria incompreensível que os próximos quase dois meses fossem ocupados com guerrilhas de alecrim e manjerona entre os ainda dois maiores partidos nacionais. Das duas, uma: ou há fundamento substantivo nas acusações a Montenegro, e ele tem de sair (necessariamente empurrado, em primeira linha, pelos seus pares partidários), ou o prolongamento do atual momento de pequenas e médias suspeições poderá acabar por favorecer a extrema-direita (embora o lado mais clubisticamente montenegrista, incluindo talvez o próprio, acredite que ganhará o plebiscito que tenta montar em torno de um misto de vitimização e eficaz marketing comunicacional). Isto também porque Pedro Nuno ainda não foi capaz (e duvido que o seja em tempo útil) de apresentar um discurso de propositura escorreito e sólido, nem parece ser dotado de condições de presença que o tornem empático e credível junto de uma parte significativa dos portugueses. Neste quadro, acrescento ainda a minha perplexidade quanto ao PSD profundo, adormecido ou inebriado à sombra do poder e de onde praticamente não aparece ninguém que fale em nome dos princípios essenciais e dos riscos potenciais que os poderão ferir ou minar a breve trecho. A situação é grave, pois, e só a política no seu sentido mais puro e duro poderá evitar derrapagens de nefastas e incalculáveis consequências – porque ainda estávamos a tempo de um “golpe de asa” (por parte de um daqueles dois líderes e com o devido respaldo por parte do respetivo opositor), tão patriótico quanto tudo indica improvável, que a enfrentasse com justeza e assim trouxesse uma nova aragem ao País...
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