domingo, 9 de março de 2025

A IMIGRAÇÃO AMERICANA – HISTORY MATTERS

 


(A grande revolução observada na economia do desenvolvimento aconteceu quando a disciplina se libertou da pretensão de ser construída de modo a-histórico, isto é, sem ter em conta as estruturas económicas, sociais e políticas do subdesenvolvimento a partir das quais a transformação. O princípio fundamental do “history matters” foi decisivo para destruir a ideia da unicidade dos percursos pré-determinados de mudança socioeconómica. Um dos patronos deste blogue, Albert O. Hirschman, cunhou esse “history matters” com os seus célebres estudos na Colômbia onde identificou vários casos de evolução “al revès”, ou seja, não canónicos, inesperados e não por isso menos virtuosos. Estas reflexões ocorreram-me quando lia o último “substack” de Bradford DeLong em que ele discute com os seus eleitores a preparação de uma aula/conferência sobre imigração inserida no seu curso de História Económica Americana (e que curso!) que ele leciona na prestigiada Universidade de Berkeley. Esta prática de grandes académicos americanos partilharem com os seus leitores as condições de preparação de uma aula ou conferência provoca-me uma sensação inaudita de saudade e será talvez por isso que nos raros sonhos que consigo reproduzir a vida da Faculdade me surge frequentemente reproduzida. Vou, por isso, reproduzir os principais tópicos definidos por DeLong para preparar esse tema da imigração. Esses tópicos equivalem a reflexões importantes num contexto em que ao que tudo indica “history doesn´t matter”, já que os ventos que correm por Washington pretendem reinventar, senão ignorar, essa mesma história, com falsidades transformadas em pressupostos factos ou evidências...)

Os princípios de reflexão anotados por DeLong são os seguintes:

“1. Com a exceção do período entre 1945 e 1995, a América é um país em que 10 a 15% da sua população nasceu no estrangeiro – a primeira geração de imigrantes ou, pelo menos, a primeira geração potencial de imigrantes …
2.    Mesmo considerando o período de 1945-1995, a riqueza e o poder global da América decorrem das suas capacidades de assimilação: porque é uma nação de imigrantes …
3.    O que é uma nação de imigrantes? Uma nação de pessoas que fogem de catástrofes no Velho Mundo e que querem construir algo melhor, juntas, no Novo Mundo …
4.    Toda a gente comprometida com esse projeto é, aos olhos a maioria dos Americanos em todo o tempo, um Americano – todos nós sendo filhos dos Pilgrims por eleição e adoção …
5.    Mas existe sempre um retrocesso – seja Benjamin Franklim ao dizer que os Alemães escuros devem ser mantidos fora da América reservada para os Homens Brancos e para os Homens Vermelhos, ou Woodrow Wilson dizendo que todos da Alemanha a norte e a ocidente estão bem mas que aqueles provenientes do sul e do este equivalerão a más notícias ou Donald Trump reclamando a deportação de toda a gente (com a exceção de Melanija Knavs vinda da Eslovénia ou de Elon Musk vindo da África do Sul) que chegou cá e começou a trabalhar ilegalmente.
6.    De modo demasiado estranho, esse retrocesso emerge sem qualquer relação com o número de imigrantes que estão por aí e que encontramos todos os dias ou mesmo com a percentagem de imigrantes no país …
7.    Sim, os imigrantes e os seus filhos assimilam-se a uma velocidade impressionante uma vez que aprendam o inglês – assim como quase todos os filhos de imigrantes o fazem …
8.    A cultura e a civilização americanas são muito atrativas – na verdade, repetem-se os pânicos morais sempre que os seus filhos se tornem americanos mesmo que nem todos vivam cá e esses pânicos morais não são irracionais …
9.    Não, os imigrantes não estão a assimilar-se de modo mais lento nesta onda do que nas ondas iniciais …
10. Sim, os imigrantes estão a mudar a cultura e a civilização americanas …”
 

Excelentes princípios de reflexão para compreender as contradições do impulso gerado pela parceria Trump-Musk.

Já agora para compreender o vasto alcance desta parceria, num tweet no X de Musk, este veio com a provocação de que o montante de despesa pública (G na simbologia regra geral utilizada) deveria ser retirado do cálculo do PIB. Ou seja, só a criação de riqueza por via privada deveria ser considerada valor. Toda o rendimento criado para redistribuir riqueza ou atender aos mais desfavorecidos deveria ser erradicado do cálculo desse valor. Se isto não é nazismo do mais puro, vou ali e venho.

Sem comentários:

Enviar um comentário