(Nos últimos dias a inspiração bloguista não tem abundado, a intensidade de trabalho não ajuda e o contexto político interno e internacional ou suscita comentários desabridos, registo em que tento não entrar, ou desincentiva o encontro com o ecrã em branco. É neste ambiente e na antecâmara de um concerto de Natal na Igreja da Lapa com Bach para massajar a irritação que me salta um tema para a reflexão, neste caso sobre a situação política interna, porque a situação internacional desanima qualquer um disposto a rejeitar a geopolítica das áreas de influência, organizada em torno dos mais fortes. É uma evidência clara que o momentum da ascensão de Trump está claramente em desaceleração, seja por diversos revezes político-legislativos que se têm observado, seja porque grande parte da população está a chegar aquele momento em que não se vive de discurso e propostas inconsequentes. Por isso, fico-me pela soberbia política do Governo, gerada quer por um PS fofinho quanto baste que estimula o ataque do Governo, quer por uma sensação protagonizada por Montenegro e os seus mais próximos, Hugo Soares e Leitão Amaro particularmente, segundo a qual as tendências que vêm de fora abrem caminho e reforçam a tal soberbia. Na influência do contexto internacional, não me refiro apenas ao estilo de governação que grassa por aí, mas também à maneira como a economia portuguesa é vista do exterior, com expressão máxima na já aqui tratada visão da revista The Economist sobre o desempenho mais recente da economia portuguesa.)
A soberba é uma palavra que tem origem no latim, superbia, que não significa nada mais do que arrogância. A soberbia política do atual Governo não resulta de pretender fazer reformas segundo o ideário político-ideológico que professa. Estaria no seu pleno direito de as promover, obviamente com a resposta e resistência democráticas de quem não acredita esse ideário, acaso a sua apresentação ao eleitorado que lhe concedeu a maioria relativa para governar tivesse integrado límpida e cristalinamente essas reformas e o seu alcance. Isso não aconteceu assim, designadamente no que diz respeito à revisão da lei laboral. A verdadeira história da decisão de apresentar uma proposta tão desequilibrada, sem fundamentos no estado da arte da economia portuguesa e com a arrogância de ter procurado dinamitar o diálogo na concertação social está por contar e só seguramente muito mais tarde saberemos o que gerou aquele desplante tão soberbo. Mais ainda não se consegue explicar a apatia com que o Governo e particularmente o primeiro-ministro (já que a ministra Ramalho não é propriamente um exemplo de empatia, antes de rigidez facial e de comportamento) reagiram ao alarido que o texto distribuído provocou. Alguma de coisa de grave se passou no relacionamento com a UGT.
Tenho para mim que este exemplo de soberbia política teve uma emergência cuidadosamente preparada. Durante algum tempo, o Governo piscou o olho descaradamente ao populismo mais imediato, com as questões da imigração e da nacionalidade. Já percebemos que esses devaneios pelo tema da pressuposta pressão imigratória correram mal para o Governo, pois a Comissão Europeia considera que o país não tem de modo algum essa pressão à perna e incluiu naturalmente Portugal nos países que têm de acolher imigrantes para atenuar o fardo pesado que outros países europeus, esses sim segundo a Comissão Europeia, estão a sentir com o fenómeno. Com esse piscar de olho ao populismo mais primário, pretendia o Governo concretizar a muito conhecida manobra de distração para fazer passar a mais desequilibrada reforma laboral dos últimos tempos na legislação portuguesa. Saíram-lhe mal as contas. Espertice, soberba política e arrogância é mais do que cocktail molotov.
A volatilidade mórbida do Chega é outra pedra no sapato. Ventura defende qualquer coisa para no dia seguinte defender o contrário, jurando fidelidade à nova inclinação, mas tudo é venal e volátil. O que comanda é o barómetro populista. Se Ventura estimar que chumbar a desejada reforma laboral e que a pressão para esse chumbo é favorável, dificilmente o Governo terá a vida fácil na Assembleia da República.
Lamentavelmente, o empresariado português, desde os grupos mais organizados até ao tecido de PME em que a aplicação das novas disposições legislativas seria mais trágica para a população trabalhadora, tem-se escondido por detrás de afirmações e avaliações redondas, não permitindo deslindar quais terão sido as pressões desenvolvidas para suscitar junto da ministra do Trabalho uma proposta tão desequilibrada. Aliás, nos tempos que correm, não é fácil discernir quem é o influenciador ideológico dos patrões. Terão Montenegro e os jovens turcos Soares e Amaro assumido o papel de oráculos do empresariado português, pensando que ganharia uns pontos na consolidação da sua maioria relativa?
A vida política é volátil e nunca se sabe o dia de amanhã … Terão assim pensado os oráculos?

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