sábado, 17 de junho de 2017

AINDA A QUESTÃO DOS 2%

(Lawrence Summers, link)


(Estamos em tempo de reconsideração da política monetária e como sempre os americanos vão na frente do debate, embora se espere que, com a desconjuntada e perigosa administração Trump, a substituição de Janet Yellen à frente do FED quando em 2018 acabar o seu mandato, possa trazer elementos estranhos ao debate sério que o tema exige…)

Há dias fiz eco neste espaço de um texto assinado por um representativo conjunto de economistas americanos propondo que o FED reveja a sua meta tradicional de 2% para a taxa de inflação, fixando um valor de referência para a taxa de inflação mais elevado. A razão da proposta consiste essencialmente em aumentar a margem de manobra do Banco Central para combater uma futura recessão, dada a situação vivida em termos de taxa de juro de curto prazo (o chamado zero lower bound) e a disseminação de cada vez mais artigos que apontam para uma descida estrutural da taxa de real de juro de equilíbrio.

O debate é rijo e terá que explorar outras dimensões do problema. Como seria de esperar, a partir do momento em que não assinou o documento acima referido, o contributo de Lawrence Summers para o debate teria de aparecer. Da sua posição foi dado um lamiré no seu blogue praticamente mensal no Financial Times, o qual vem trazer ao documento em questão novos cambiantes de discussão. É conhecida a posição de Summers em relação ao controlo do mandato do FED através da chamada curva de Philips, a célebre curva que estabelece uma relação entre a evolução dos preços (salários) e da taxa de desemprego, bem como o seu ceticismo relativamente ao cálculo da também célebre NAIRU (a taxa de desemprego não aceleradora da inflação ou por vezes imperfeitamente designada de taxa de desemprego de equilíbrio).

Summers tem uma expressão intrigante (link)para o paradigma de política monetária que propõe em alternativa à utilização da problemática curva de Philips: “a shoot only when you see the whites of the eyes of inflation”. A expressão vem da Revolução Americana e consistia numa ordem militar de disparar só em determinadas condições, the whites of their eyes. A contenção de Summers explica-se pelo facto de ser sempre mais fácil corrigir o tiro de uma inflação que está em alta do que intervir precipitadamente e provocar uma recessão escusada e desproporcionada. As evidências jogam a favor de Summers: a inflação evolui regra geral de forma lenta pelo que é sempre mais fácil corrigir o tiro de uma intervenção ligeiramente tardia.

O que parece indiscutível para Summers é que o confronto das previsões do FED com as expectativas expressas pelo mercado evidencia um desencontro notório. Pode, assim, dizer-se que o FED está em parte desacreditado pelas suas previsões. A aceleração da inflação não é vista como uma ameaça pelas expectativas dos mercados. Para além disso, o respeito escrupuloso pela regra dos 2% colocaria o produto potencial bem acima do valor em que afinal se encontra hoje o produto da economia americana. E, argumento que me parece o mais promissor, o efeito estímulo de uma dada descida da taxa de juro tenderá a ser provavelmente cada vez mais baixo, dado o contexto de estagnação secular pelo qual Summers tanto porfia.

Por isso, é com curiosidade que esperaremos pelos desenvolvimentos que Summers promete apresentar brevemente. Para já, sabemos que considera a elevação da taxa de inflação de referência não a melhor solução, sugerindo que melhor seria por exemplo trabalhar com uma meta de referência para o crescimento económico. Veremos que novos desenvolvimentos virão a debate.

Sem comentários:

Enviar um comentário