(Em tempo de
recuperação económica na economia americana, que já vem dos tempos de Obama,
parece absurdo que o tema da estagnação secular não tenha desaparecido do
debate, mas à medida que se ouve Larry Summers a falar do
assunto, compreendemos que a estagnação secular aponta para questões de bem
mais longo prazo do que a conjuntura atual)
O tema da estagnação secular foi colocado em debate há quase quatro anos
numa conferência do FMI em Washington em 2013 através de uma intervenção
controversa como sempre de Lawrence (Larry) Summers (ver link aqui). A mobilização do título
utilizado por Alvin Hansen nos anos 30 tinha por foco a economia americana, mas
há investigação posterior que o estendeu às economias avançadas. O facto do
conceito de estagnação secular ser desenvolvido em torno de uma crise estrutural
de procura torna-o controverso, num mundo em que a economia da oferta parecia
ter ganho a contenda que Keynes no seu tempo tanto se esforçou por denunciar. A
resistência à utilização do conceito é compreensível e os seus detratores
pareciam ter respirado de alívio com a recuperação mais significativa da
economia americana. Mas a verdade é que o desenvolvimento de argumentos em
maior profundidade, explorando a intuição e os primeiros argumentos de Summers,
tem vindo a ganhar expressão. E a questão da recuperação da economia americana
em nada belisca o conceito, pois ele remete para questões estruturais e de
longo prazo, que não podem ser nem confundidos, nem apagados por uma conjuntura
mais favorável.
Summers voltou à carga esta semana numa intervenção em conferência do
Federal Reserve Bank of San Francisco, introduzindo uma nuance de reforço de argumentação
(ver link aqui para quem tiver paciência para ouvir a sua intervenção), a que o
próprio Wall Street Journal deu a devida importância. O facto do tema da
estagnação secular ter dado origem a um vasto painel de explicações não é prova
de fraqueza da tese, antes ajuda a compreender a relevância dos fatores estruturais
que poderão estar na base da ameaça estagnacionista. Seja por razões demográficas
que limitam o crescimento do produto potencial, pelo incremento da aversão ao
risco e da escassez de ativos seguros, pela influência da desigualdade e
aumento correlacionado da propensão à poupança dos mais ricos, pela influência
de uma lodosa intermediação financeira, pela descida do preço relativo do
capital ou pela explosão de poupanças empresariais e aumento da lucratividade,
a verdade é que todos estes argumentos podem contribuir para a descida da taxa
de juro neutral ou de equilíbrio ou também como é chamada a taxa de juro R*.
Pois na sua intervenção na conferência de São Francisco, Summers regressa
com a ideia de que a estagnação secular corresponde a um estádio mais
desenvolvido da crítica à chamada Lei de Say, a célebre ideia por cuja denúncia
Keynes tanto se bateu. Assim, não só a oferta não cria a sua própria procura,
como a falta de procura tende a determinar a redução da oferta, a que Summers
chama uma lei de Say ao contrário. Ou seja, haverá um efeito de histerésis na insuficiência
de procura estrutural, prolongando o seu efeito pela sua influência redutora da
oferta. A variável chave que acompanha o raciocínio de Summers é a TIPS (Treasury
Inflation-Protected Securities a 10 anos), mostrando que ela está em
queda ao longo das últimas cinco décadas.
A estagnação secular não é, porém, uma lei determinista, ela representa uma
conjetura teoricamente fundamentada sobre o futuro a partir da informação
conhecida e integrando sobretudo tudo o que nos possa anunciar o modo como os
agentes económicos estão a projetar a inflação a longo prazo.
Neste cenário de estagnação secular reforçada, é óbvio que o investimento público
adquire importância redobrada, não apenas uma variável contra-cíclica necessária,
mas antes algo que deve corresponder a uma racional avaliação de necessidades
de infraestruturação a longo prazo. Que a economia americana por força de um presidente
passadista e desestruturado vá perder a batalha dos investimentos públicos a
favor de uma economia verde corresponde a uma antecipação que certamente
reforçará o espectro da estagnação secular na economia americana, mas isso é
areia demais para aquela cabeça.
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