domingo, 4 de junho de 2017

SECULAR STAGNATION AGAIN




(Em tempo de recuperação económica na economia americana, que já vem dos tempos de Obama, parece absurdo que o tema da estagnação secular não tenha desaparecido do debate, mas à medida que se ouve Larry Summers a falar do assunto, compreendemos que a estagnação secular aponta para questões de bem mais longo prazo do que a conjuntura atual)

O tema da estagnação secular foi colocado em debate há quase quatro anos numa conferência do FMI em Washington em 2013 através de uma intervenção controversa como sempre de Lawrence (Larry) Summers (ver link aqui). A mobilização do título utilizado por Alvin Hansen nos anos 30 tinha por foco a economia americana, mas há investigação posterior que o estendeu às economias avançadas. O facto do conceito de estagnação secular ser desenvolvido em torno de uma crise estrutural de procura torna-o controverso, num mundo em que a economia da oferta parecia ter ganho a contenda que Keynes no seu tempo tanto se esforçou por denunciar. A resistência à utilização do conceito é compreensível e os seus detratores pareciam ter respirado de alívio com a recuperação mais significativa da economia americana. Mas a verdade é que o desenvolvimento de argumentos em maior profundidade, explorando a intuição e os primeiros argumentos de Summers, tem vindo a ganhar expressão. E a questão da recuperação da economia americana em nada belisca o conceito, pois ele remete para questões estruturais e de longo prazo, que não podem ser nem confundidos, nem apagados por uma conjuntura mais favorável.

Summers voltou à carga esta semana numa intervenção em conferência do Federal Reserve Bank of San Francisco, introduzindo uma nuance de reforço de argumentação (ver link aqui para quem tiver paciência para ouvir a sua intervenção), a que o próprio Wall Street Journal deu a devida importância. O facto do tema da estagnação secular ter dado origem a um vasto painel de explicações não é prova de fraqueza da tese, antes ajuda a compreender a relevância dos fatores estruturais que poderão estar na base da ameaça estagnacionista. Seja por razões demográficas que limitam o crescimento do produto potencial, pelo incremento da aversão ao risco e da escassez de ativos seguros, pela influência da desigualdade e aumento correlacionado da propensão à poupança dos mais ricos, pela influência de uma lodosa intermediação financeira, pela descida do preço relativo do capital ou pela explosão de poupanças empresariais e aumento da lucratividade, a verdade é que todos estes argumentos podem contribuir para a descida da taxa de juro neutral ou de equilíbrio ou também como é chamada a taxa de juro R*.

Pois na sua intervenção na conferência de São Francisco, Summers regressa com a ideia de que a estagnação secular corresponde a um estádio mais desenvolvido da crítica à chamada Lei de Say, a célebre ideia por cuja denúncia Keynes tanto se bateu. Assim, não só a oferta não cria a sua própria procura, como a falta de procura tende a determinar a redução da oferta, a que Summers chama uma lei de Say ao contrário. Ou seja, haverá um efeito de histerésis na insuficiência de procura estrutural, prolongando o seu efeito pela sua influência redutora da oferta. A variável chave que acompanha o raciocínio de Summers é a TIPS (Treasury Inflation-Protected Securities a 10 anos), mostrando que ela está em queda ao longo das últimas cinco décadas.

A estagnação secular não é, porém, uma lei determinista, ela representa uma conjetura teoricamente fundamentada sobre o futuro a partir da informação conhecida e integrando sobretudo tudo o que nos possa anunciar o modo como os agentes económicos estão a projetar a inflação a longo prazo.

Neste cenário de estagnação secular reforçada, é óbvio que o investimento público adquire importância redobrada, não apenas uma variável contra-cíclica necessária, mas antes algo que deve corresponder a uma racional avaliação de necessidades de infraestruturação a longo prazo. Que a economia americana por força de um presidente passadista e desestruturado vá perder a batalha dos investimentos públicos a favor de uma economia verde corresponde a uma antecipação que certamente reforçará o espectro da estagnação secular na economia americana, mas isso é areia demais para aquela cabeça.

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