(Abaporu, pintura de Tarsila do Amaral, que se transformou num dos símbolos do modernismo no Brasil)
(Não esperaria
encontrar num artigo de Miguel Sousa Tavares na Bola um epitáfio tão arrasador
de um político para quem já trabalhei já há alguns anos, mas o que é curioso é ser também um epitáfio
não menos arrasador de uma organização competente que já o foi e que já claramente
não o é …)
Apesar de SLB convicto de há muitos anos, sobretudo a partir da data em que
me vi com o meu Pai no centro do velho e extinto Estádio da Luz, não sou leitor
assíduo da Bíblia da Bola e por isso não acompanho com regularidade as crónicas
de Miguel Sousa Tavares naquele jornal.
Em curto período de férias e preocupado pela mais que provável necessidade
de recomposição de toda uma defesa (onde toda a estabilidade de uma equipa
começa), por cedência de um amigo vi-me a folhear as peripécias relatadas pela
Bola de ontem em matéria de contratações, cedências e outras negociatas que
longe de me acalmarem ainda mais me preocuparam. Mas onde me detive com mais
atenção foi na crónica de Miguel Sousa Tavares nas últimas páginas do jornal,
onde constatei um duplo epitáfio arrasador, sobre uma organização que já foi
competente e sobre um político que encontrou nessa organização um abrigo
oportuno.
Tenho seguido com atenção, algum gozo e por mais estranho que pareça alguma
mágoa, o declínio organizacional do FCP como organização. Estou à vontade e sem
conflito de interesses para o dizer, pois fui dos que não tive qualquer
problema em considerar que o FCP já foi dos projetos mais consistentes que a
região Norte em tempos apresentou em termos organizacionais. Numa época em que
a Norte predominavam os calimeros, o FCP de Pinto da Costa, sobretudo depois de
limpar algumas heranças decorrentes de más companhias, emergiu como uma
organização competente, bem apetrechada e sobretudo muito profissional. Alguns
colegas meus admitiram que o FCP poderia ser o Barça do Norte, alicerçado numa
perspetiva de combate regional contra a sobranceria da capital e forjado por
uma identidade nortenha. Nunca comunguei dessa ilusão e o tempo veio a dar-me
razão, até porque a Norte outros projetos (Braga e Guimarães) vieram
mostrar que o estatuto de Barça era areia de mais para aquele projeto.
Ao mesmo tempo que o FCP emergia como organização competente e
internacionalmente respeitada, e com resultados evidentes, diga-se, o meu SLB
agonizava, primeiro com o bebido Vilarinho e depois com a vigarice de João Vale
e Azevedo (e sua estrutura, incluindo a Teresa Coelho, candidata à CM de
Lisboa) à solta.
A evolução comparada das duas organizações é curiosa e tem muito para
oferecer em termos de postura organizacional. Ambas acolhem em seu redor
símbolos de modernidade, misturadas com dimensões arcaicas e da mais suspeitosa
origem e contiguidade. As próprias personalidades centrais, Pinto da Costa e
Luís Filipe Vieira, navegam em domínios de alguma contiguidade, mesmo que os
passivos bancários possam ser diferenciados, penalizando o segundo. Em meu
entender, os sinais de modernidade nunca se substituíram definitivamente aos
elementos arcaicos e de duvidosa convivência. Aliás, tenho para mim, que os
momentos de baixa de cada organização coincidem com o levantar cabelo dos
elementos arcaicos e os momentos em alta com o domínios dos sinais de
modernidade, mas a tensão existe sempre, ditada pela propensão do mundo do
futebol acolher o arcaísmo e o duvidoso. O momento atual das duas organizações
reflete a minha tese. E aqui é que a minha tese se cruza com o artigo de Miguel
Sousa Tavares. Protagonistas principais como Pinto da Costa e Luís Filipe
Vieira não mudam estruturalmente da noite para o dia. Podem variar de humor,
mas os seus traços de comportamento não mudarão facilmente. Portanto, as
diferenças virão de elementos da estrutura, designadamente das SAD respetivas.
Ora uma boa comparação do que poderemos designar por fatores de modernidade é o
confronto entre Fernando Gomes administrador responsável pela direção
financeira da SAD FCP e Domingos Soares de Oliveira e Nuno Gaioso Ribeiro na
SAD do Benfica. O artigo de MST é arrasador para Fernando Gomes e choca-me
bastante ver um político que foi promissor e competente estar agora ao serviço
da cobertura do arcaísmo, contribuindo para que esse arcaísmo vença a
modernidade numa organização que já foi competente. MST não o refere mas Soares
de Oliveira e Nuno Gaioso Ribeiro são seguramente responsáveis pelo facto de
Luís Filipe Vieira parecer ter virado um gestor de exceção. Em contrapartida,
Fernando Gomes está na linha do prolongamento do arcaísmo. A crónica de MST é
bem mais arrasadora do que esta minha interpretação.
Todo o futebol português é uma tensão permanente entre estas duas forças.
No estado atual, predominarão mais Fernandos Gomes do que Oliveiras e Gaiosos e
enquanto essa tensão não se resolver a favor da modernidade todos os resultados
serão efémeros.
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