segunda-feira, 5 de junho de 2017

AS ELEIÇÕES NO REINO UNIDO E A AUSTERIDADE




(Os trágicos e bárbaros acontecimentos de Manchester e Londres ofuscam por razões compreensíveis um outro debate que as eleições da próxima quinta-feira deveriam poder refletir e que dificilmente o farão nestas circunstâncias; estou a referir-me à perigosa combinação de sequelas de Brexit e da orientação pró-austeridade que o governo de Theresa May insiste em continuar a seguir)

A vitória dos Conservadores na última eleição ganha pela dupla Cameron-Osborne, entretanto autoafastados na sequência dos resultados do BREXIT, representou um dos mais impressionantes exemplos de mistificação de resultados macroeconómicos. Para isso contribuiu a canhestra inabilidade trabalhista de então, na qual se destacou a graçola do ex-ministro das finanças trabalhista que comunicou em mensagem ao seu seguidor conservador que os cofres estavam vazios. Cameron e Osborne ganharam então as eleições de modo contundente sem nunca terem de responder à pergunta incómoda de saber as razões de terem prosseguido uma política de austeridade quando a situação macroeconómica recomendava o contrário e o Reino Unido tinha condições únicas para o fazer. A opção de Cameron e Osborne era então claramente ideológica. A redução da despesa pública correspondia, não a um argumento de estabilidade orçamental, mas antes a um propósito claro de desconstrução da intervenção pública em várias áreas.

A governação de Theresa May em rota para a negociação do Brexit não tem sido substancialmente diferente e ainda nestes dias os conservadores vêm salpicada a sua política orçamental de cortes pelo impacto que eles tiveram na operacionalidade das forças policiais e de segurança. A sua intervenção desesperada no sentido de reforçar essa operacionalidade é o melhor indicador dos problemas criados.

Simon Wren-Lewis na sua coluna do Mainly Macro (link)e presença mediática tem tido uma persistente ação de denúncia desse erro de conceção da política macroeconómica conservadora, procurando romper o que pode ser classificado como uma manta de ocultação dos verdadeiros custos da desproporcionada e descontextualizada austeridade conservadora. A sua ação converge com a de alguns economistas fortemente referenciados neste blogue que procuram desconstruir a ideia de que no longo prazo o crescimento económico é apenas determinado pela dimensão da força de trabalho, pelo stock de capital e pela tecnologia, entendida esta sobretudo como um conjunto de ideias com valor económico. As insuficiências de procura normalmente associadas a fenómenos de curto prazo podem ter efeito sobre o produto a longo prazo (ainda ontem falávamos da Lei de Say ao contrário), possibilidade que altera decisivamente as formulações constantes dos manuais de macroeconomia mais disseminados pela formação graduada em economia.

A verdade é que se têm sucedido os estudos demonstrando que os choques fiscais negativos como aqueles que são gerados pelas políticas de austeridade sistemática e contracíclica podem ter efeitos persistentes na destruição de produto. Wren-Lewis refere um estudo recente do instituto alemão IMK (link) que aprofunda trabalhos anteriores de Blanchard e Leigh (link) para o FMI e de Summers e Fatas (link) no qual a persistência da queda do produto aumenta significativamente o impacto das políticas de austeridade. Citando: “Em vez de desaparecerem em 2013, estes custos persistem e crescem com cada operação adicional de consolidação, Em 2016/17, o PIB será cerca de 4% mais baixo e mais um 1% será adicionado por via da austeridade adicional programada até 2019/20. Se acumularmos essas perdas, isso leva a que a família média tenha perdido 13.000 libras até 2016/17, aumentando para 23.000 libras até 3 anos depois”.

Isto explica que o produto potencial do Reino Unido esteja 15% abaixo da sua tendência passada.

É espantoso como os conservadores conseguem ocultar esta perda desproporcionada e desnecessária. Sem efeitos do BREXIT, esclareça-se.

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