(A mensagem de
Natal permitiu finalmente que o primeiro-Ministro António Costa encontrasse o
registo equilibrado que se lhe pedia noutras ocasiões e que faltou então
assegurar. Com o tema dos fogos
florestais de junho e outubro já suficientemente debatido neste blogue, que
Costa tratou desta vez com a devida ponderação, é a criação de mais e melhor
emprego que centra a minha atenção.)
O tema do “mais e melhor
emprego” é politicamente apetecível pois influencia diretamente fortemente as
expectativas e as condições de vida de todos os ativos e, indiretamente, de
todos pois as suas repercussões no equilíbrio da Segurança Social são por
demais conhecidas. Objetivamente, são as contribuições para a segurança social
dos que hoje estão empregados que financiam as pensões e reformas dos que
ganharam entretanto esse estatuto.
Se declinarmos o “mais e
melhor emprego” nas suas duas componentes de “mais” e “melhor” ressaltam alguns
temas de reflexão que ajudam a calibrar expectativas. Analisemos, por agora, o
“mais”, embora o post queira
concentrar-se no “melhor”.
Quanto ao “mais emprego”,
quando é perspetivado como agora num período de recuperação económica plena, o
comportamento da variável emprego não pode deixar de ser lida em conjunto com
pelo menos três aspetos: (i) a evolução concomitante da produtividade; (ii) a
evolução da taxa de participação para medir se a crise terá afastado
definitivamente ativos do mercado de trabalho; (iii) o estádio de
desenvolvimento económico do país e o estado da arte do seu modelo produtivo em
termos da sua adaptação aos desafios da globalização.
A partir de 2009, o
comportamento das duas variáveis é flagrantemente oposto. A taxa de emprego não
deixou de cair e a produtividade real euro por hora trabalhada cresceu
permanentemente. Não podemos afirmar com segurança que o comportamento
combinado reflita uma mudança estrutural. O que seria importante é que o
aumento da produtividade coexistisse com o aumento da taxa de emprego. Fui à
procura de informação que me permita seguir o período 2014-2016 com esse foco.
Começando pela taxa de emprego, os valores de 2014 a 2016 apresentam um
crescimento relativamente sustentado, embora ainda com valores inferiores aos
de 2005 (70,6% contra 72,2%). Encontrei na base AMECO da DG Economic and Financial Affairs valores para o PIB por pessoa
empregada a preços de 2010, que constitui um sucedâneo. O gráfico para os três
anos é o seguinte:
Como é compreensível, a
relação entre taxa de emprego e produtividade não é indiferente ao tema do
“melhor emprego”. A qualidade do emprego é de natureza multidimensional. Mas há
duas variáveis que, regra geral, se impõem: os níveis salariais e a sua
dispersão/desigualdade e a precariedade no trabalho. Fui à procura de
indicadores comparativos para nos situarmos comparativamente. A percentagem de
trabalho temporário no escalão etário dos 15 aos 24 anos em relação ao trabalho
total é um bom indicador de precariedade. O gráfico abaixo mostra que, ao
contrário da União a 28, em que o fenómeno parece contido, em Portugal e
Espanha não para de crescer. Não pode ignorar-se que nem todo o trabalho
temporário pode ser entendido como trajetórias apontadas à precariedade
exclusiva. Duas situações tendem a minorar essa possibilidade. Por um lado, o
trabalho temporário significa para alguns jovens algum ganho de experiência de
participação no mercado de trabalho e de procura de novas oportunidades. Por
outro lado, existem atividades em que o trabalho temporário é parte
indissociável do processo produtivo.
Há quem refira também os
indicadores de trabalho a tempo parcial (part time) como indicador de
precariedade. É mais seguro não utilizar este indicador de forma bruta e antes
determinar a percentagem de ativos empregados a tempo parcial que aceitaria de
bom grado um trabalho em tempo integral. A percentagem que é atribuída a
Portugal de trabalhadores a tempo parcial que estão nessa situação por não
encontrarem um emprego a tempo integral oscilou nos últimos 4 anos entre 36 e
39%, valor que é quase metade do observado em Espanha, que tem dos valores mais
elevados em torno dos 60%. O trabalho a tempo parcial tem contudo em Portugal
uma expressão mais reduzida do que na União a 28.
De qualquer modo, a
Comissão Europeia publica um indicador de precariedade. Para o grupo etário dos
15 aos 64 anos, o valor do indicador tem-se situado nos últimos quatro anos
entre os valores de 3,1 e 3,5%, com propensão para diminuir. A DG Emprego e
Assuntos Sociais publicou em 2016 um excelente estudo sobre a matéria, cobrindo
comparativamente todas as situações geradoras de risco de precariedade (ver link aqui).
A preocupação do
primeiro-Ministro com o tema do “melhor emprego” tem que ver essencialmente com
duas dimensões: a necessidade dos apoios à inovação empresarial (fortíssimos e
abundantes no PT 2020) produzirem efeitos em termos de contratação de recursos
humanos e de confirmar no mercado de trabalho a lenta e sustentada subida das
qualificações superiores dos jovens portugueses. No quadro do desenvolvimento
desigual que ainda imperará por muitos anos na União Europeia, Portugal não
pode furtar-se, embora o possa minimizar, ao efeito de rapina das suas melhores
qualificações, fruto da relação entre nível de desenvolvimento económico e
padrão remuneratório à paridade de poderes de compra. As políticas públicas
orientadas para reduzir a diáspora qualificada podem ser parcialmente frustrantes.
O desenvolvimento desigual não se apaga por magia, sobretudo quando no interior
da União há pouca convicção para o reduzir a mínimos temporais de mudança
estrutural.
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