(A atípica
campanha eleitoral na Catalunha está no fim, com cadeiras vazias em palco e
muita demagogia a povoar o discurso político, antecipando-se uma derrota
estrondosa do PP com debandada dos seus eleitores para o CIUDADANOS e tempos complexos
de uma negociação complexa. Poderia
ter sido de outra maneira?)
Ainda hoje de manhã ouvia na rádio Antena 1
um discurso incendiário de Gabriel Rufián (mas que nome bem aplicado!),
deputado em Madrid da Esquerda Republicana, e compreendia que a Catalunha está
de novo perante um lio negocial sério, tanto mais enovelado quanto mais se
percebe que negociadores de boa vontade há poucos.
Como não se desejava, a campanha eleitoral
foi atípica, mas não menos intensa, com a imagem das cadeias vazias dos
encarcerados Junqueras e outros e com Puigdemont a fazer de grande exilado que
não é a partir de Bruxelas como os elementos de maior atipicidade.
Tal como o oportuno artigo do El País o ajuda
a compreender (link aqui), não pode dizer-se que as intenções de voto estejam
objetivamente estabilizadas.
Observaram-se algumas oscilações que
poderemos resumir assim: (i) o CIUDADANOS manteve-se em crescendo, sobretudo através
da irrequietude da sua candidata Inês Arrimadas, sobretudo alimentada pela contínua
deserção de eleitores PP para os lados da formação liberal catalã e pelo piscar
de olhos a personalidades independentes como Vargas Llosa, embora eu seja cada
vez mais cético quanto ao valor eleitoral dessas bandeiras (lá e cá); (ii) a Esquerda
Republicana continua a dominar o lado independentista, mas teve dinâmicas
contraditórias desde a aplicação do 155, reforçou-se primeiro face aos seus
pares, caindo depois; mesmo assim, poderá ter o maior número de lugares no Parlament;
(iii) as restantes forças independentistas continuam a bicar-se mutuamente, com
acusações de diferente teor e a oscilar na sua posição; o partido de Puigdemont
parece não ter unhas para liderar de novo a banda independentista, apesar de ser
o boneco mais popular entre os truculentos “caganers” (bonecos artesanais de
personalidades defecando); a CUP parece confinada no seu radicalismo e a aliança
Podemos-Ada Colau pode ter alguma palavra a dizer, embora abaixo dos 10%; o
Partido Socialista catalão do bonacheirão e colaborativo Miguel Iceta fez ressurgir
um pouco a sua expressão eleitoral, mas não chega para uma aliança de governação
com Arrimadas e suas tropas; finalmente, o PP está entregue à sua irrelevância
na Catalunha, terá de batalhar muito para chegar aos 6% e isso diz tudo.
Pela síntese das sondagens mais recentes que
está disponível, o CIUDADANOS arrisca-se a ter uma vitória de Pirro em termos
de votos, ou seja não suficiente para liderar em termos de deputados e aquém
dos resultados necessários para forçar com Miguel Iceta uma governação
constitucional da Catalunha. Os independentistas parecem estar contidos na sua
força eleitoral, mas a verdade é que podem bloquear qualquer alternativa de governação
e podem até formar governo, admitindo que as bicadas recíprocas vão parar. Há,
por conseguinte, um cenário do tipo baralhar e voltar a dar, mas com as cartas negociais
praticamente na mesma posição. O que não é propriamente o que o PP desejaria, até
para poder cumprir as promessas que fez de não se opor a qualquer iniciativa de
reformulação constitucional. A aliança entre PODEMOS (em deflagração interna cada
vez mais evidente) e a alcaldeza Ana Colau (CeC) pode ser decisiva na negociação
futura, mas, pelas sondagens existentes, o somatório Ciudadanos + PSC + CeC
ainda se apresenta inferior ao dos independentistas.
Tudo isto tem uma moral de história que é para
mim cada vez mais evidente. Podemos todos estar de acordo contra o
aventureirismo dos independentistas, o irritante supremacismo catalão e a campanha
de desinformação que os independentistas foram construindo ao longo do tempo,
no mais puro modelo de agit pro como
não se conhecia revigorado há tanto tempo. Mas o sentimento independentista está
lá, até porque me recuso a aceitar que os catalães sejam estúpidos ou de baixa
literacia média. Assim sendo, pese embora a criatividade de Arrimadas (num partido
que, convém não ignorá-lo, começou por ser iniciativa do que de melhor existia
entre os intelectuais cívicos catalães) e a disponibilidade agregadora e
colaborativa de Iceta, falta força a uma alternativa constitucional. Dá a
impressão de que os ganhos CIUD e PSC não cavam decisivamente no universo dos independentistas,
a não ser que à boca das urnas haja uma tomada de consciência de última hora.
Por isso, não custa imaginar que toda a instabilidade
é possível depois do dia 21 D, embora haja muitos dias até ao Natal e Reis.
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