(O Governador do
Banco de Portugal prossegue a sua meritória tentativa de chamar a atenção para
a necessária recuperação do investimento (público e privado) e sobretudo para a
mudança do seu modelo de financiamento. Fê-lo hoje através de uma conferência realizada com o apoio e
participação ativa do Banco Europeu de Investimento, a norte, mais propriamente
no Porto)
Carlos Costa tem sido
coerente na sua cruzada por um novo modelo de financiamento do investimento
empresarial das PME portuguesas. O modelo atual é fortemente vulnerável pela
sua dependência do crédito bancário, o qual não é manifestamente o parceiro
ideal para assegurar a qualidade desse investimento, particularmente do chamado
investimento inovação. Como pano de fundo deste problema temos um outro, que é
o mais baixo grau de autonomia financeira das PME relativamente às suas congéneres
europeias. Aliás, facto abundantemente mencionado pelo Banco de Portugal nas
suas análises realizadas a partir da Central de Balanços da instituição. A
conferência de hoje assentava numa estratégia inteligente. Trouxe para a
ribalta da discussão o estudo do BEI – Investment Report
2017-18 – From Recovery to Sustainable Growth. Com isso permite
uma avaliação comparativa nos 27 da posição portuguesa e convida empresas e especialistas
nacionais para refletir sobre o problema acima assinalado à luz do referencial
comparativo de um estudo com a fiabilidade de uma instituição como o BEI.
Tenho de confessar que é
um pouco simultaneamente dececionante e irritante continuar a ouvir falar da
baixa capitalização das PME portuguesas há mais de 40 anos e pressentir que o problema
subsiste, sem qualquer perspetiva de avaliação conhecida das razões do falhanço
de inúmeras tentativas realizadas a nível público para colmatar o problema. Recordo-me
que nos meus primeiros anos de docência na FEP (há quanto tempo isso já vai)
discutíamos um estudo do então GEBEI (João Cravinho e outros) no qual o problema
era destacado com clareza e rigor. A resposta ao amável convite do BP tinha em
conta a minha curiosidade para com o estudo do BEI e sobretudo para ouvir
alguns dos intervenientes que regra geral nunca defraudam as minhas expectativas,
como os economistas e amigos Alberto Castro e Guilherme Costa e os engenheiros e
tecnólogos José Carlos Caldeira (Agência Nacional de Inovação) e José Manuel
Mendonça (INESC TEC).
Ora a manhã de hoje
confirmou as expectativas que tinha, num ambiente que anuncia um bom sinal, ou
seja, falar-se de investimento e discutir em que termos está assegurada a
sustentabilidade da sua recuperação.
O estudo do BEI é uma
boa oportunidade para atualizar conhecimento comparativo, mas é do confronto entre
os dois painéis que saíram as perspetivas mais interessantes. O primeiro painel,
moderado pelo jornalista do Expresso João Vieira Pereira e com intervenção
inicial de Alberto Castro que assumiu essencialmente o chapéu de Chairman da
Instituição Financeira para o Desenvolvimento, pode resumir-se no confronto
financiamento bancário versus outros modelos de financiamento (como o private equity, o capital de risco e
outras formas). O segundo, moderado pelo colega Professor Álvaro Aguiar e com
introdução inicial de José Carlos Caldeira, centrou-se sobretudo na questão das
políticas de inovação e seu financiamento, com duas intervenções pelo meio
muito protocoladas de um homem da Comissão Europeia e de um quadro do BEI,
apenas para marcar presença.
Refiro-me hoje apenas ao
primeiro painel, no qual continuo a não perceber bem que valor acrescentado tem
a moderação de um jornalista. Mas não é disso que me interessa falar. É
sobretudo relevante trazer para a reflexão a intervenção do Guilherme Costa,
com o qual tenho travado algumas reflexões relevantes sobre uma outra maneira
de colocar a questão empresarial na agenda política. A perspetiva de GC
coloca-se em torno da ideia de que a gestão pode ser um instrumento poderoso de
criação de valor, num contexto em que a propriedade das empresas não é um direito
divino à sua gestão. Para isso, é crítico de uma agenda de recuperação sustentável
do investimento empresarial e da sua qualidade com base num modelo exclusivo de
capitalismo “pioneiro” e schumpeteriano, muito “Silicon Valley”, o mundo dos
start-up’s de base tecnológica. Na nota escrita que suporta a sua intervenção e
que amavelmente o GC me fez chegar é possível ir mais fundo do que a sua intervenção
suscitada no modelo utilizado por interpelações do moderador. Destaco apenas a
introdução ao ponto 1:
“Em matéria
de investimento, estaremos todos de acordo sobre a importância do investimento
inovador para o crescimento da nossa economia!
Mas
estaremos todos igualmente de acordo em pôr a par da capacidade de empreender a
capacidade de administrar, de gerir, como fator essencial do crescimento das empresas
e da economia portuguesa?”
O tema tem pano para mangas e voltarei a ele proximamente. A proposta de GC
lembra-me e bem a velha posição de Harvey Leibenstein que distinguia ao contrário
de Schumpeter entre N-entrepreneurship
(o empresário inovador) e o R-entrepreneurship
(o empresário de rotina, o adopter). Se
considerarmos em associação ao R-entrepreneurship
as questões do saber gerir e administrar então a reflexão de GC pode levar-nos
bem longe.
Ou seja, parafraseando alguém que compreenderá bem esta questão, há mais
vida para além do capitalismo disruptivo, muito WEB SUMMIT.
No fim de contas, uma manhã produtiva, sobretudo se lhe acrescentar as
reflexões suscitadas pelo segundo painel, que ficam para um próximo post.
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