(Mais alguns desenvolvimentos em torno do artigo de Roberta
Capello e Giovanni Perucca de Novembro 2018 na Regional Studies, sobretudo do ponto de vista da operacionalização e
medida dos conceitos apresentados. Matéria interessante anda por este artigo, com um elevado
potencial de aplicabilidade.)
Vimos no post anterior que a
abordagem se organizava em torno de dois conceitos fundamentais: o de sensibilidade,
que mede a necessidade e desejabilidade de uma dada política e o de recetividade
que mede duas coisas, o modo como a qualidade das instituições é percebida e a
aceitação dos valores europeus. Ambos os conceitos apresentam uma dimensão
objetiva e uma outra subjetiva. O que quer dizer que para a primeira dimensão
será necessário conceber e calcular indicadores e que para a segunda teremos de
recorrer a inquéritos de opinião (existentes ou expressamente realizados para o
efeito). A tarefa é hercúlea pois não estamos a falar de indicadores globais
para a política de coesão, mas antes para os domínios das políticas que a
configuram (economia, de I&D, turismo, tecnologias de informação e
comunicação, saúde, energia e ambiente e sociedade). Ou seja, muito trabalhinho
pela frente.
Comecemos pela dimensão objetiva das reais necessidades das regiões.
Esta dimensão é talvez a mais elaborada e a que nos traz mais desafios e
novidades. A conceptualização é relativamente simples. Numa dada região e para
o recurso que estrutura o domínio da política de coesão (por exemplo, na
economia, o investimento), a existência de necessidades reais convoca a
comparação entre a oferta e a procura desse recurso. A existência de
necessidades reais vem associada a um desequilíbrio entre oferta e procura
potencial não resolvido por via do mercado. É importante notar que a procura é
potencial e não a atualmente manifestada. Exemplos:
- A dotação de TIC e de transportes assegurada pelo setor privado não é assegurada devido aos custos elevados que esse fornecimento implica: neste caso a necessidade real corresponde a uma insuficiência de oferta face à procura;
- Na presença de externalidades negativas (poluição ambiental, por exemplo), a necessidade real corresponde a uma situação em que a oferta do recurso que gera a externalidade negativa excede a procura;
- A oferta de políticas sociais é inferior à procura de apoios sociais.
A operacionalização desta abordagem passa sobretudo pela resolução dos problemas
(sérios) de medida da procura potencial, já que para as variáveis de oferta a
informação estatística existente resolve a contento o problema. A metodologia
seguida por Capello e Perucca encerra alguma sofisticação, embora aparentemente
a ideia de base seja simples. A oferta de um dado recurso numa dada região é entendida
como diretamente dependente do conjunto das características da procura, por sua
vez determinadas pelas características da Região. O desequilíbrio entre oferta
e procura é medido por um fator de erro que representa a tal medida imperfeita
das necessidades reais da Região. Esta abordagem tem que se lhe diga pois
equivale a admitir que o modelo considerado consegue especificar todas as
características relevantes da procura e que nada de relevante fica de fora. O
artigo apresenta detalhadamente os indicadores de oferta e procura considerados
para cada um dos domínios de política de coesão, o que constitui um auxiliar precioso
para compreendermos as dificuldades da operacionalização.
Em matéria de medida das dimensões subjetivas, da perceção do que é que a Região
necessita e da perceção da qualidade das instituições e aceitação dos valores
europeus, Capello e Perucca baseiam-se fundamentalmente em inquéritos de opinião
publicados. Para a perceção das necessidades das Regiões, os autores convocam o
Eurobarómetro e sobretudo os resultados das questões colocados aos inquiridos
sobre as prioridades de intervenção que as instituições europeias devem
assegurar. Para ultrapassar a questão da representatividade regional (NUTS II) das
respostas válidas, os autores trabalham várias edições do Eurobarómetro tentando
obter essa representatividade. Apesar de todas as reservas que podem colocar-se
aos indicadores objetivos, esta convocação do Eurobarómetro deixa-me pouco
satisfeito, sobretudo atendendo ao facto de que as políticas de coesão não
constituem o core desse inquérito aos Europeus.
Quanto à proximidade com os valores europeus, já me parece credível que o
indicador utilizado seja o da percentagem de votos em partidos que não são
eurocéticos. No que respeita à perceção da qualidade das instituições, os autores
baseiam-se num estudo específico realizado pela Universidade de Gotemburgo em
colaboração com a Comissão Europeia. O estudo mede a nível sub-nacional a qualidade
percebida das instituições. Nada a opor.
Resumindo, embora a introdução na abordagem da perceção pelos cidadãos das
necessidades das regiões penalize a consistência da abordagem dados os
problemas de recolha de informação atrás assinalados, o estudo de Capello e
Perucca vale sobretudo pelas pistas que traz ao desenvolvimento de estudos para
grupos mais reduzidos de NUTS II sobre a perceção das políticas de coesão. Bastaria
a tentativa para operacionalizar um modelo de medida de necessidades reais das regiões
para justificar a valia que atribuo ao artigo.
Sem comentários:
Enviar um comentário