(Eduardo Estrada, http://elpais.com)
A vitória de Bolsonaro não é de todo fácil de digerir, também por parte de quem acreditou que o Brasil tinha irreversivelmente atingido uma maturidade democrática capaz de resistir às piores demagogias. Há em mim qualquer coisa de ferido no meu sentimento para com um país que tive oportunidade de conhecer bem em muita da sua imensa diversidade cultural, geográfica ou rácica.
Volto a ler com cuidado as explicações de Fernando Henrique Cardoso (FHC), publicadas em inúmeros jornais nacionais e em alguns internacionais sob o título “O futuro do Brasil”. Retenho cada linha e cada palavra dos três últimos parágrafos (abaixo reproduzidos): as “causas mais profundas”, a “mais tecnológico-financeira” diferenciação da “sociedade contemporânea”, o vazio das ideologias, a “comunicação direta”, primeiro; a impotência imediata e o “muito a construir” no futuro, a necessidade de “autocrítica” dos “partidos e lideranças derrotados” para encararem as “novas circunstâncias”, o desmentido de uma “volta ao fascismo” por contraponto a “outras formas de pensamento e ação não democráticas”, o apelo às Forças Armadas para que sirvam de “barreira de contenção” a explosões de “grupos exaltados”, depois; “a batalha a dar-se é a de reconstituição da institucionalidade democrática em sociedades interconectadas e fragmentadas”, por fim. E concluo: a racionalidade, o conhecimento e a experiência são presenças incontestáveis no texto de FHC; como o seu patriotismo e a evidência das suas convicções democráticas; não obstante ter de aceitar que talvez esta possa ser a posição que melhor serve o futuro do Brasil à luz dos riscos que ele enfrenta, continuo incapaz de aceitar – sem qualquer “avaliação moral” mas “também de boa fé” – que não tivesse sido possível fazer diferente para evitar o desastre e o sofrimento que com ele virá...
Sem comentários:
Enviar um comentário