(A forma como alguma direita portuguesa se posiciona face
ao autoritarismo sectário de personagens como Trump ou Bolsonaro e aos seus resultados
eleitorais já aqui foi referenciada como um sinal do contrapeso de funcionamento
da economia de mercado que esta gente gostaria de implantar. As palavras de José Pacheco Pereira no artigo de
hoje do Público têm o registo certo e chamam as coisas pelos seus nomes, como convém
nestes tempos.)
O artigo vale pelo seu todo, mas destaco um excerto (link aqui):
“(…)Mas estes homens têm uma corte,
porque o poder autocrático tem uma capacidade enorme de atrair a
degenerescência da virtude, de poder ser usado para comprar e vender interesses
e para dar aos pequenos da mesma espécie a ilusão de que também são grandes, porque
estão à sombra dos gigantes. Aqueles a quem tenho chamado os nossos
bolsonarinhos e trumpinhos desdenham Bolsonaro e Trump e não quereriam ver-se
em sua companhia à mesa. (E daí não sei... Talvez, depende, não é impossível,
podia ser, e se for uma selfie, não ficava mal, para pôr na mesa de
cabeceira...) Por isso juram a pés juntos que não gostam deles. MAS GOSTAM DO
QUE ELES ESTÃO A FAZER. Vai em maiúsculas por que é isso mesmo.
De uma forma tão
evidente, tão psicologicamente evidente, tão reveladoramente evidente, sentem
conforto e uma íntima vingança por eles baterem na “esquerda”, por eles
desprezarem as “elites” (excepto as elites económicas, que dessas eles gostam e
não desprezam), por eles serem “politicamente incorrectos”, por eles porem na
ordem a comunicação social, que se julga superior e de referência, por eles
serem o azorrague de Hollywood, do “pântano”, dos bem pensantes, por eles
desprezarem a academia, a ciência, o saber. Gostam deles e pouco se importam
por eles fazerem o trabalho sujo. Fazem-nos crescer uns centímetros. Há lá um
sorriso enterrado e escondido atrás da boca dos bolsonarinhos e trumpinhos.”
O autoritarismo ditatorial que vai a votos e é por eles validado exige como
é óbvio uma reflexão aprofundada sobre a qual e na medida das minhas parcas possibilidades
tenho tentado oferecer alguns contributos. Mas por vezes são necessárias palavras
duras e sérias como as de Pacheco Pereira para lhes devolver a toda a importância
devida. Estou a marimbar-me para a questão de saber se é ou não legítima a
atitude deplorável dos que se abstiveram no Brasil de condenar a ascensão de Bolsonaro
invocando o motivo da condenação necessária do PT. Admito que o seja. Mas esse
não é o ponto nevrálgico da questão. O fundamental é barrar o caminho aos que não
hesitarão em utilizar as benesses da democracia para a reduzir ao vazio. Não é
uma questão de legitimidade, mas antes de necessidade histórica, sobretudo se a
soubermos ler com inteligência.
Para muito boa (má) gente, isto das leis de mercados terem de se submeter às
regras da convivência e da barganha social, da regulação comprometida com a
erradicação dos abusos de poder e de posição dominante, ter um autoritarismo validado
pelos votos daria muito jeito. Nunca se terão libertado dessa ambição. Quando
ela emerge como viável, validada pelo jogo democrático, mesmo que viciado, por
muito que possam disfarçar e invocar questões de legitimidade é difícil esconderem
que, tal como Pacheco Pereira o escreve com maiúsculas, “gostam do que eles (os
autocratas validados pelos votos) estão a fazer”.
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