domingo, 24 de março de 2019

AMARGURA E FECHAMENTO


Um Lunch with do “Financial Times” com Wolfgang Schäuble que acaba por funcionar como uma entrevista de balanço de fim de vida política para o ex-todo poderoso ministro alemão das Finanças e, antes, rival frustrado de Angela Merkel à sucessão de Helmut Kohl na liderança da CDU. Muito interessante de ler, a vários títulos, embora apenas remeta aqui o leitor para aqueles que dizem respeito aos temas de maior candência e impacto em termos da atualidade ou do passado recente em termos europeus e nacionais. Primeiro, a austeridade e a sua dupla confissão de pena por ter desempenhado um papel “em tudo isso” e de impotência quanto à perceção do que poderia ter sido feito de modo diferente – nenhum arrependimento, afinal, e também nenhum avanço minimamente consequente no pensamento. Depois, a crise da Zona Euro e a sua avaliação de erro em se ter tentado criar uma moeda comum sem uma política económica, de emprego e social comum e de conformismo quanto a um presente em que considera impensáveis passos de integração mais significativos – pensa-se ele confortavelmente instalado, pois, no impasse em que a construção europeia está mergulhada. Em seguida, a questão grega e a sua insistência na ideia que sustentou em 2015, e então inviabilizada por Merkel e outros responsáveis, das vantagens de um timeout de dez anos em relação à presença do país na Zona Euro – sempre certo e sem grandes dúvidas, aí permanece ele incapaz de tomar em consideração os factos supervenientes e de os incorporar numa leitura razoável e capaz de contribuir para evitar a repetição futura de dramas inaceitáveis no interior de um “clube” proclamadamente uno e solidário. Por fim, Merkel e a visibilidade de um mal-estar e de um despeito que nunca logrou intimamente ultrapassar e que agora prefere reduzir a uma mera boa consciência associada ao seu sentido de dever e à sua continuada lealdade. Ao jeito de apontamento conclusivo, necessariamente muito guiado pelas impressões de ordem pessoal que se me foram fazendo sobressair, a entrevista de um homem abatido, entristecido e até certo ponto derrotado, de um homem bastante mais comum do que foi procurando fazer crer e passar, de um homem inteligente mas profundamente imbuído de uma genética germânica por demais rígida, arrogante e castradora, leia-se, sem espaço para ouvir e ponderar – e muito menos para partilhar com abertura mínima – outras visões.

(excertos de https://www.ft.com)

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