Apesar de já ir tendo uma provecta idade, confesso que vivi na tarde de ontem um momento profundamente instrutivo, que no tocante ao meu próprio enriquecimento pessoal quer no tocante à completude da minha formação cidadã (iniciada in illo tempore com a frequência da disciplina de “Religião e Moral”, essa bem mais consequente do que a de “Cidadania e Desenvolvimento” com que agora alegadamente querem adulterar a consciência dos nossos jovens).
Na dita reunião, longa e concorrida, foi-me permitida a oportunidade de recorrer às minhas leituras de Verão para ilustrar modos de sentir e pensar. A dada altura, admiti rever-me em Julian Barnes (“O Ruído do Tempo”) quando escreve: “Toda a vida confiara na ilusão. Imaginara que esse traço nascera no lugar habitual: no intervalo entre o que imaginamos, supomos ou esperamos que a vida virá a ser e aquilo em que realmente ela se torna. Assim, a ironia torna-se uma defesa do eu e da alma; deixa-nos respirar diariamente.” Noutra circunstância, usei a caraterização de Agustina (“As Pessoas Felizes”) segundo a qual “um homem devorado por opiniões” corresponde a “uma maneira de ignorar os pensamentos”. Essa mesma Agustina que também sentencia (“Prazer e Glória”) que “o português é leal em cinco minutos, durante uma vida em que muitos cinco minutos se repetem.” E, por fim, ainda pude citar a polaca Olga Tokarczuk (“Viagens”) quando tão lucidamente afirma: “Existem dois pontos de vista acerca do mundo: a perspetiva da rã e a vista do pássaro em pleno voo. Qualquer ponto entre estes dois só serve para gerar o caos.” Sei bem o que pretendi deixar no ar ou em algumas cabeças mais respeitáveis, embora esteja muito longe de estar convencido de o ter conseguido plenamente na forma cifrada que adotei – mas basta-me dizer o que posso no quadro do que a consciência me dita, sendo que reconduzo o resto para o velho conformismo guterrista do “é a vida”!
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