Um gráfico que é toda uma evidência de décadas de imobilismo político no setor, por um lado, e de quanto mal têm feito as medidas curto-prazistas e desviantemente incentivadoras de atrações turísticas e de fixação de estrangeiros no País, por outro. E tudo indica que as apressadas tentativas de utilização dos dinheiros do PRR, ademais potenciadas por distorções da concorrência e desregramentos migratórios, pouco farão pelo setor de modo ordenado e eficientemente distribuído em termos geográficos e de necessidades sociais efetivas – afinal, trata-se de gastar depressa e não de investir com planeamento e racionalidade...
sábado, 4 de janeiro de 2025
sexta-feira, 3 de janeiro de 2025
NÚMERO REDONDO
(Ainda há dias fechava um post com a curiosidade de que 2025 iria ser um ano de quadrado perfeito, mais propriamente de 45 ao quadrado. E aqui estou eu a invocar que amanhã será um dia de número redondo, mais especificamente 50. Sim, cinquenta anos de casado com a Companheira de sempre é obra e algo para celebrar. Já compreenderam que não sou tipo que goste de me expor demasiado, mas alinho hoje com uma exceção a esse princípio, pois em tempos de turbulência de relações por todo o lado e por todo o mundo, manter com saúde e ânimo sempre revigorado uma relação de cinquenta anos não é algo que possamos ignorar e não celebrar. Dando graças pelas condições de saúde que a vida nos proporcionou e pela família que pudemos consolidar, filhos, noras e netos, mesmo que repartidos numa geografia que não facilita os contactos físicos frequentes, AMOR, TOLERÂNCIA e RESPEITO MÚTUO são fatores que podem explicar a resiliência de uma relação, a sua reinvenção e adaptação à chegada inexorável da biologia do envelhecimento. Sou dos que pensa que as condições de resiliência nas relações familiares não são necessariamente extrapoláveis para as sociedades. Mas neste caso acho que seria capaz de construir um projeto de sociedade baseado nestes três princípios e como as sociedades democráticas estão deles necessitados.)
Cinquenta anos passaram sem que déssemos praticamente por isso e é o presente dessa conquista que amanhã celebramos por estas bandas de Seixas. O futuro ainda espera por nós com a incerteza que o aumento da esperança de vida necessariamente implica, não sabendo antecipar como é que o corpo se comportará e que surpresas, boas ou más, nos reserva.
Só espero que tu Mité e eu possamos viver conjuntamente, por mais algum tempo, com ânimo e com condições aceitáveis de saúde esses tempos de incerteza que os setenta e mais anos nos proporcionam.
AÍ ESTÁ O FUTEBOL A ABRIR 2025!
(cartoon de Henrique Monteiro, http://henricartoon.blogs.sapo.pt)
Hoje, o futebol regressa nas nossas paragens e em outras para além das inglesas. Um fim de tarde e início de noite em cheio, começando com um Nacional-FC Porto que até pode não acontecer (aquela localização nevoeirenta da Choupana!) e que servirá de bom comprovativo sobre a efetividade da melhoria portista e culminando com um Vitória de Guimarães-Sporting que evidencia quão pouco adequadas são as permissivas regras prevalecentes (um treinador a enfrentar na mesma época a sua antiga equipa!) e que servirá igualmente de bom comprovativo sobre a real força da “nova juba” leonina. Pelo meio, um Conceição contra Conceição a contar para a Supertaça italiana, jogado na Arábia Saudita e a representar a estreia do pai Sérgio ao serviço do AC Milan. Depois, e durante o fim de semana, teremos os embruxados clubes de Manchester, onde Guardiola e Ruben Amorim, por muitas explicações que se avancem, parecem tolhidos por peçonhas absolutamente incompreensíveis.
quinta-feira, 2 de janeiro de 2025
SE O RIDÍCULO FOSSE MÚSICA...
A existência de uma Mensagem de Ano Novo do Presidente da República é uma boa tradição, embora desde há muito tornada inofensiva – por um lado, porque a larga maioria dos portugueses escassa atenção lhe presta e, por outro lado, porque normalmente a sua substância é generalista e vaga, um pouco como o “Melhoral” que “não faz bem nem faz mal”.
Mas, e por muito que os titulares e intervenientes na “bolha” procurem disfarçá-lo, a mensagem de Marcelo deste início de 2025 assumiu proporções de acentuado descoco. Isto na medida em que, na sua penúltima mensagem ao abrigo do cargo, continuou a omitir o essencial: a necessidade cada vez mais imperiosa de reformarmos e transformarmos a nossa economia e sociedade; o que Marcelo substitui por exigências pias de execução do PRR, independentemente de qualquer especificação do que em tal poderia estar em causa. Ao que acresce a dimensão política propriamente dita, onde a ausência dá lugar ao queixume, aqui e ali mesclado com um certo tom de ameaça dirigido ao primeiro-ministro – sendo que o apelo ao “bom senso institucional” e à preservação da “cooperação estratégica” mais não representam do que o desespero de um “poderoso” acantonado nos seus fantasmas de isolamento e irrelevância. O Presidente afirmou ainda a sua preocupação com a pobreza no País, uma constante de todo o mandato sem que a ela tenha dedicado qualquer iniciativa com eficácia e razão de ser (sempre preferindo as inconsequentes ações populistas junto dos sem-abrigo). Por fim, a nossa primeira figura do Estado disse coisas óbvias sobre alguns dos temas da atualidade (“é preciso melhorar a educação e a saúde”) e evitou claramente tratar de outros (seguração e imigração, nomeadamente), quiçá para não atiçar o “Chega”, além de ter referido meras banalidades acerca da situação internacional (do impacto do regresso de Trump à necessidade de uma Europa com peso militar próprio) – aqui, estava a falar para quem em matérias que praticamente não dependem de Portugal?
Crescentemente indómitos, os comentadores televisivos e radiofónicos bem se esforçam por ir dando um sentido às permanentes e intrometidas presenças de Marcelo nas nossas casas, embora graças a Deus infrutiferamente – ainda hoje ouvia Ângela Silva no “Expresso da Manhã” e pensava em quão limitado, ou condicionado (deliberadamente ou não), tem de ser o racional analítico (e até a desfaçatez!) desta gente para dizer o que diz sem pensar em se colocar “orelhas de burro” pela forma incompetente e despudorada como exerce a profissão ao serviço de agendas estranhas e que já não são deste século...
O BARÓMETRO EUROPEU VISTO DE PORTUGAL
(O Barómetro Europeu Standard é um dos raros instrumentos de avaliação da opinião pública e dos 27 que pode ser analisado ao longo do tempo, já que tem base trimestral, é desenvolvido há algum tempo e cobre diferentes aspetos da vida pública. Este instrumento representa assim uma oportunidade de testar a disseminação precipitada de perceções, já que pelo menos resulta de uma sondagem de opinião e não de construções políticas à medida dos interesses inconfessáveis prosseguidos por tais forças políticas. Vou por isso recorrer ao barómetro de outubro de 2024 para apalpar o pulso ao sentimento dos portugueses. Vale o que vale e a regra fundamental é não pedir mais a uma evidência do que ela pode efetivamente oferecer.)
Em matéria de nível de satisfação dos cidadãos, já algum tempo que o país apresenta níveis de satisfação inferiores aos dos países europeus em média, tendo esse nível de satisfação estado desde 2017 entre os 70 e os 80%, para 85% do referente comunitário. Na escala comunitária estamos mais para baixo do que para cima, mais propriamente temos o quarto mais baixo nível de satisfação com as condições de vida entre os 27. Como economista do desenvolvimento devo reconhecer que este resultado está em linha com o nosso desvio de desenvolvimento face à média da UE. Nem sempre o nível de desenvolvimento económico está em linha com o nível global de satisfação, mas neste caso, com um PIB per capita abaixo da média europeia e tendo em conta a desigualdade existente não me espanta o alinhamento dos dois indicadores.
Do ponto de vista da identificação dos problemas que afligem os portugueses, seguramente que as nossas “prioridades” não estão propriamente em linha com as europeias: 43% dos portugueses considera que a inflação, as condições de saúde e a habitação dominam as suas preocupações, não aparecendo temas como a segurança, a imigração e as questões climáticas no topo das preocupações portuguesas. Talvez Montenegro não tenha lido convenientemente o barómetro.
Já no que respeita ao nível de satisfação com o funcionamento da democracia, estamos mais para cima do que baixo na hierarquia comunitária, com 61% dos portugueses a considerarem-se satisfeitos com essa variável. O indicador de satisfação português tem melhorado, o que parece ser música que agrade ao posicionamento do Chega e de outros profetas da desgraça.
Um outro indicador em que os portugueses se destacam positivamente da maioria dos seus parceiros europeus é o nível de confiança nos media. Para uma média de 65% de confiança na informação dos media na UE, o nível de confiança português é surpreendentemente de 85%. Os portugueses parecem bondosos para com os seus media. Não sei como interpretar rigorosamente esta valoração dos portugueses, sobretudo no quadro de um país em que os jornais agonizam, mas obviamente existe a televisão e ainda me causa por isso mais interrogação esta valoração.
Em termos de confiança e de valoração da imagem da UE, a dissonância face à Europa ainda é mais saliente. Estamos situados logo a seguir à Dinamarca nessa valoração: 67% face aos 51% da média europeia. Valeria a pena explicar esta dissonância positiva. Dir-me-ão alguns que serão os Fundos Europeus Estruturais e presentemente o PRR a gerar essa valoração. Mas não posso ignorar que a notoriedade desses Fundos em Portugal é baixíssima, o que representa uma contradição nessa interpretação. Talvez a explicação mais consequente seja a de olhar para a União como um potencial de aumento do nível de desenvolvimento do país.
Em matéria de ligação à realidades nacional e europeia, obviamente que a ligação nacional ganha de longe (98% contra 66%), mas ainda assim a ligação à União supera a da média europeia.
Em coerência com os indicadores atrás referidos, os portugueses parecem estar mais fortemente ligados à necessidade de ajuda à Ucrânia do que os Europeus em média (79% contra 55% relativamente à forma como a União tem ajudado o país invadido). E também não será surpresa, que os riscos do alargamento sejam claramente mais valorados cá do que na União: em termos de consequente instabilidade e insegurança 36 contra 22% e em termos de efeitos sobre o mercado de trabalho 35 contra 29%.
Sintetizando, o barómetro revela em Portugal uma certa sabedoria média bastante cristalina.
quarta-feira, 1 de janeiro de 2025
INCERTEZA QUE NÃO PERMITE ILUSÕES
Cá pelas minhas bandas, o ano começou bem, sem sobressaltos e apresentando-se climaticamente lindo e até algo solheiro (apesar de um frio cortante).
O primeiro dia também foi calmo e cheio de dolce far niente, com incursões variadas (do Concerto de Ano Novo de Viena à leitura, do jogo do Arsenal ao visionamento de uma série). Nada que me iluda quanto ao que vamos ter nos restantes trezentos e sessenta e quatro dias (ou nas tendências dominantes dos mesmos): sei bem que a incerteza que nos envolve é radical e assim tentarei certamente aproveitar o conselho da cartunista quanto à exigência de não deixarmos de antecipar deceções.
Mas não sendo este o dia azado para fazer mais do que insistir nesta tónica, que não me cansarei de sublinhar, remeto para posts a vir a exploração dos temas primordiais que estarão na agenda deste ano da graça de 2025.
PACE, FRATTELANZA E AMORE IN TUTTO IL MONDO
(Este post de arranque de 2025 não era para ser assim chamado e tinha pensado num título alternativo que seria o de “ainda não foi desta”. O motivo e o contexto da alteração prendem-se com a minha tradição pessoal de assistir “religiosamente” ao Concerto de Ano Novo no Musikverein de Viena e todos os anos, também religiosamente, sonhar que um dia, cada vez menos provável, poderia estar ali naquela mítica sala e deliciar-me com a harmonia galante de toda aquela cena. Mas a força da presença do maestro Riccardo Muti, com a excelência dos seus 83 anos, impôs a mudança de título, porque na sua língua materna, o italiano e que bem ela soou naquele ambiente austríaco, desejou a todos os presentes e aos milhões que assistem pela Eurovisão ao acontecimento o singelo e bondoso desejo de “pace, frattelanza e amore in tutto il mondo”. Bem sei que transição de um terrível 2024 para provavelmente um não menos terrível 2025, o Concerto de Ano Novo com a sua ambiência representa uma dissonância de harmonia e beleza que alguns considerarão mórbida face à tumultuosa transição em que o mundo se encontra. Bem sei ainda que provavelmente naquele seleto auditório estarão apoiantes da extrema-direita que grassa também pela Áustria, aliás antecipando o que haveria de manifestar-se em países vizinhos um pouco mais tarde. Estou consciente de tudo isso, mas não consigo resistir ao charme da harmonia musical e da dança que se desprendem do Musikverein. Chamem-lhe ilusão, escape, dissonância, o que quiserem. Mas já canta mais um Concerto de Ano Novo.)
Compreensivelmente, o post é curto e esgota-se praticamente na sua introdução. Tal como a presença imponente de Riccardo Muti e a qualidade insuperável da Filarmónica de Viena se sobrepõem a todo aquele ambiente galante, sofisticado e pleno de beleza nas flores dos jardins de Viena que são ali convocadas para completar o cenário.
Sabemos que a música também é dissonância e tantas obras existem em que a dissonância nos atrai e seduz. Mas no Concerto de Ano Novo a música tem de significar harmonia. Há tempo bastante para a dissonância.
Ainda não foi desta, é verdade. E provavelmente nunca o será. Mas poder usufruir mesmo à distância daquela ambiência já é por si retribuidor.
Os problemas ficam para amanhã.
Nota final
Já me esquecia. Pela primeira vez no Concerto de Ano Novo foi tocada uma peça de uma mulher: estou a falar da obra de uma compositora associada à família Strauss, uma menina prodígio chamada de Constanze Geiger, com 12 anos de idade escreveu em 1848 a Valsa de Fernando. Simbólico, não?