terça-feira, 14 de janeiro de 2025

ALMIRANTE E RUTTE, A MESMA LUTA!

O Almirante na reserva foi de férias, o que sublinhou como “umas merecidas férias”, mas deixou no espaço público um mote que me parece ir ser prevalecente em matéria de opções futuras, quer nacionais quer europeias. Sublinho um quarteto de ideias-força provenientes da sua intervenção de despedida: (i) a defesa de que a Europa deve reforçar a sua ligação à NATO – “a autonomia estratégica da Europa, per si, é muito difícil num mundo que se está a tornar bipolar”, em que a instabilidade internacional é muito forte e em que se movimenta agressivamente um parceiro como a Rússia(que “dentro da Europa tenta mudar regimes democráticos e convertê-los em proto democráticos”); (ii) a defesa adicional de que “não é só a segurança que está em causa, é a própria construção europeia e a nossa prosperidade, equidade e liberdade” e de que a solução para a Europa também passa por “uma reindustrialização inteligente”, com a aposta na Defesa a poder ser determinante para “resolver o problema”; (iii) em termos nacionais, o necessário reconhecimento de que não nos podemos alhear de um problema que nos pode afetar e de que tal implica escolhas e, nesse enquadramento, de que forçosamente “haverá alguma afetação nas despesas sociais”; (iv) e o aviso final, sob forma interrogativa, “o que interessa ter despesas sociais se não tivermos país ou se tivermos que obedecer a uma autoridade exterior, ainda por cima ditatorial?”

 

Poucos dias depois, o secretário-geral da NATO, o holandês Mark Rutte, veio insistir nas posições que vem sustentando desde que assumiu o cargo, agora sob uma formulação nua e crua, quase brutal: ou os aliados da NATO gastam mais na Defesa ou começam a aprender a falar russo, disse. É claro que Rutte não tem grande moral política para afirmar coisas com este caráter impositivo e extremado, ele que foi um primeiro-ministro visivelmente “pouco europeu” enquanto exerceu a sua função em Haia; mas não o é menos que a sua observação comporta notoriamente uma chamada de atenção que acaba por ser essencialmente definidora da atual fase de impasse, incapacidade decisional e declínio por que passa a vida europeia. Lamentavelmente, nada do que se vai sabendo – vendo, ouvindo e lendo – indica que alguém esteja ou possa vir a estar cabalmente ao leme de uma Europa que persiste oscilante entre o amedrontado e o acobardado, por um lado, e a aparente comodidade de um business as usual por demais evidenciador de completa impotência e míngua de visão para abanar a inércia reinante, por outro. Com tudo o que de péssimo apontam as previsões internacionais para 2025, já para não referir os aspetos agravantes que provirão do que sempre advém de inesperado, o mais certo é que a continuidade daquela imobilista ordem europeia facilmente possa traduzir-se em desordem da grossa nessa nossa vizinhança e, obviamente portanto, estender-se inexoravelmente para dentro das nossas vulneráveis portas (onde as maravilhosas cosméticas das cativações, dos excedentes e da baixa do endividamento não lograrão resistir ao regresso à tona das desgraças estruturais em que continuamos mergulhados, quiçá desta vez explicitamente descritas através de um dilema tendencialmente irresolúvel entre despesas sociais requeridas e despesas militares obrigatórias) – e não haverá, então, Almirante que nos valha...

(Nicolas Vadot, http://www.levif.be)

Sem comentários:

Enviar um comentário