quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

PACE, FRATTELANZA E AMORE IN TUTTO IL MONDO

 


(Este post de arranque de 2025 não era para ser assim chamado e tinha pensado num título alternativo que seria o de “ainda não foi desta”. O motivo e o contexto da alteração prendem-se com a minha tradição pessoal de assistir “religiosamente” ao Concerto de Ano Novo no Musikverein de Viena e todos os anos, também religiosamente, sonhar que um dia, cada vez menos provável, poderia estar ali naquela mítica sala e deliciar-me com a harmonia galante de toda aquela cena. Mas a força da presença do maestro Riccardo Muti, com a excelência dos seus 83 anos, impôs a mudança de título, porque na sua língua materna, o italiano e que bem ela soou naquele ambiente austríaco, desejou a todos os presentes e aos milhões que assistem pela Eurovisão ao acontecimento o singelo e bondoso desejo de “pace, frattelanza e amore in tutto il mondo”. Bem sei que transição de um terrível 2024 para provavelmente um não menos terrível 2025, o Concerto de Ano Novo com a sua ambiência representa uma dissonância de harmonia e beleza que alguns considerarão mórbida face à tumultuosa transição em que o mundo se encontra. Bem sei ainda que provavelmente naquele seleto auditório estarão apoiantes da extrema-direita que grassa também pela Áustria, aliás antecipando o que haveria de manifestar-se em países vizinhos um pouco mais tarde. Estou consciente de tudo isso, mas não consigo resistir ao charme da harmonia musical e da dança que se desprendem do Musikverein. Chamem-lhe ilusão, escape, dissonância, o que quiserem. Mas já canta mais um Concerto de Ano Novo.)

Compreensivelmente, o post é curto e esgota-se praticamente na sua introdução. Tal como a presença imponente de Riccardo Muti e a qualidade insuperável da Filarmónica de Viena se sobrepõem a todo aquele ambiente galante, sofisticado e pleno de beleza nas flores dos jardins de Viena que são ali convocadas para completar o cenário.

Sabemos que a música também é dissonância e tantas obras existem em que a dissonância nos atrai e seduz. Mas no Concerto de Ano Novo a música tem de significar harmonia. Há tempo bastante para a dissonância.

Ainda não foi desta, é verdade. E provavelmente nunca o será. Mas poder usufruir mesmo à distância daquela ambiência já é por si retribuidor.

Os problemas ficam para amanhã.

Nota final

Já me esquecia. Pela primeira vez no Concerto de Ano Novo foi tocada uma peça de uma mulher: estou a falar da obra de uma compositora associada à família Strauss, uma menina prodígio chamada de Constanze Geiger, com 12 anos de idade escreveu em 1848 a Valsa de Fernando. Simbólico, não?
 

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