Fechou ontem à meia-noite o horrível mercado que domina o futebol e faz dele uma realidade tão questionável quanto continuadamente apaixonante. Não vou aqui meter-me nos detalhes desse mundo bastante obscuro que é o das detenções e transações de passes de jogadores e das engenharias financeiras e expedientes dos tão admirados empresários sanguessugas que aos poucos vão tomando conta dos acontecimentos, antes apenas pretendo sublinhar o modo profissional e ambicioso, outros bem diriam aventureiro e protelatório, como os maiores clubes portugueses enfrentaram estes meses de defeso.
Visto de fora, o Sporting terá sido aquele que mais ficou a perder, muito devido à saída inevitável de Gyökeres, o sueco que foi o seu ganha-pão nestes anos titulados, mas também porque vendeu Harder e não logrou adquirir Jota Silva por inacreditável e imperdoável falha de último minuto (ficando-se assim pela curta entrada de Luis Suárez) e, ainda, porque esteve desatento ao facto de não ter uma linha defensiva suficientemente capaz da consistência necessária para assegurar a luta pelo campeonato (como demonstrou no passado Sábado em Alvalade contra o FC Porto).
O Benfica, por seu lado, mais parece aquele tipo, brutalhão mas pouco inteligente, do “agarrem-me senão eu mato-o” – no caso, “agarrem-me senão eu compro”, aplicado ao que quer que seja e para preencher qualquer lugar que depois se há de ver. Durante semanas, o alvo prioritário era João Félix (que pena que não tenha vindo!), depois foi Thiago Almada, falhado este foram vários outros de muitas origens e qualidades e sempre anunciados como a “última Coca-Cola do deserto” (Moussa, Amoura, Carlos Álvarez, Brahim Díaz, Dybala, Zaniolo, Solomon, etc. etc.), até que vieram a sobreposição de Barrenechea e Richard Ríos (levando à venda de Florentino e a uma interrogação sobre a paciência do excelente Aursnes e o destino de Manu Silva), um avançado inexperiente (Ivanović) que permitiu a dispensa do herói da Champions (Aktürkoğlu) para o Fenerbahçe e permitirá a manutenção no limbo de Schjelderup e Prestianni, um criativo contratado à pressa (Sudakov) para substituir Kökçü (e sentar Leandro Barreiro) e um extremo descoberto no último dia (Lukébakio) para disfarçar o abandono de Di Maria (e a lesão de um não dispensado por lesão como Bruma). Embora outras situações tenham sido bem resolvidas, designadamente o caso dos laterais defensivos (Dedić, Dahl, Obrador, a somar a Bah), ficam dúvidas quanto aos guarda-redes (Trubin dá garantias suficientes?) e ao eixo da defesa (onde Otamendi vacila de vez em quando mas continua intocável, não obstante poder vir a lesionar-se e a ter de sair de cena). Ou seja: uma confusão de focos, muito investimento (130 milhões) e algum redundante ou inútil, um mercado comandado pelo fantasma das eleições de outubro que Rui Costa quer muito ganhar.
Foi o FC Porto que melhor abordou o dito mercado. Quer pelas figuras irrelevantes ou gastas (a maioria delas associadas a atletas esforçados mas limitados) de que se viu livre com claras vantagens financeiras em várias situações, entre vendas de passes e poupanças de salários – casos de Otávio Ataíde, André Franco, Namaso, Gonçalo Borges, Iván Jaime, Samuel Portugal, Fábio Cardoso, Baró, Grujić, Fran Navarro, Zé Pedro, João Mário e Francisco Conceição, este uma exceção à regra acima explicitada –, quer pela enorme revolução operada no plantel através de 11 contratações (Froholdt, Gabri Veiga, Alberto Costa, Borja Sainz, Bednarek, Kiwior, Pablo Rosário, Luuk de Jong, Prpić, Nehuén Pérez e João Costa), muitas largamente cirúrgicas e já testadas nas primeiras jornadas da Liga, quer pela recuperação conseguida de dois excelentes jogadores que vinham evidenciando baixa de rendimento (Pepê e Alan Varela), quer pela manutenção no grupo do categorizado capitão Diogo Costa e do “menino de ouro” Rodrigo Mora (que foi protagonista involuntário de uma novela inventada pelos comentadores da Capital, a despeito de ser mais do que claro que o seu talento carece ainda de ser trabalhado no sentido de o tornar mais forte e mais útil ao jogo coletivo), quer sobretudo pela contratação de um verdadeiro coach como é Francesco Farioli, a meu ver um treinador (focado, personalizado, liderante, sabedor, competente, lúcido e sereno) como há muito não se apresentava algum pelas nossas bandas clubísticas. Os portistas partiram para esta nova época com vários tipos de dúvidas metódicas e de fundo, talvez mesmo algo desconfiados e incrédulos, mas o primeiro mês de competição trouxe-lhes uma esperança justificada de que o seu FC Porto voltou e vai estar na primeira linha do combate pelos títulos nacionais e internacionais.


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