(O debate televisivo com os candidatos à Câmara Municipal do Porto é, em meu entender, marcado por duas insuficiências graves da parte dos políticos que nele participaram. Primeiro, aceitar fazer o debate em Lisboa é de uma falta de espinha que até doi, nunca tal condescendência passaria pela cabeça de políticos de outro tempo, revelando a falta de respeito da SIC por tudo que transcende os muros estreitos da capital. Segundo, aceitar fazer o debate sem a presença de Filipe Araújo, que poderíamos classificar como o candidato incumbente, dado o papel assumido no executivo de Rui Moreira, também não diz o melhor dos palradores de serviço. Poderíamos discutir se por exemplo se Nuno Cardoso deveria estar ou não no debate, mas a ausência de Filipe Araújo anulou a possibilidade de se esgrimir o que é que do legado de Rui Moreira interessa ou não preservar. Esta minha animosidade não significa que não tenha gostado do debate e que as intervenções não tenham dignificado a Cidade, incluindo o candidato do Chega que chega à discussão bem preparado e informado sobre os assuntos relevantes da Cidade, sendo o primeiro representante do Chega que vejo com um mínimo de preparação sobre as questões autárquicas. A discussão foi relativamente civilizada e até com equilíbrio manifesto de qualidade de ideias, o que me apraz registar.)
Entre os temas suscitados no debate que julgo ser importante trazer para este espaço de reflexão, creio que o mais sugestivo é aquilo que considero ser uma distração imperdoável de Pedro Duarte. Veremos se a campanha de PS e de Manuel Pizarro será capaz de ir fundo na crítica da deriva puramente elitista do candidato do PSD e se isso poderá ter algum impacto no desfazer da proximidade que se antevê as sondagens revelaram sobre os dois candidatos.
Não faço a mínima ideia se Pedro Duarte terá sido aconselhado, pessimamente aconselhado por algum apparatchik de serviço, mas a ideia de que o Porto tem gente a mais e que tal resulta de um excesso de população face ao estilo de vida calmo e recatado que ele propõe para a Cidade é peregrino e de uma pobreza confrangedora de visão urbana. Se existem no Porto problemas de excesso de ocupação em alguns espaços da Cidade isso obviamente não se deve a problemas de população residente, mas a dois outros fenómenos que estão intimamente associados à atratividade da Cidade. Primeiro, é o turismo responsável pela agitação que tanto preocupa Pedro Duarte. Ora ver um homem do PSD confundir estes dois aspetos revela uma impreparação autárquica de bradar aos céus e apetece recomendar ao candidato algumas leituras sobre o fenómeno urbano, sobretudo para lhe relembrar que densidade e Cidade são praticamente sinónimos. Não é tempo para reviver a polémica da cidade dos pastorinhos que Fernando Gomes urdiu quando o shopping do Bonsucesso trepou pelas alturas acima. Segundo, uma das fontes da agitação que Pedro Duarte parece ignorar resulta do facto do Porto ser ainda uma cidade de serviços e continuar a atrair população residente de outros municípios metropolitanos, isto independentemente de municípios como a Maia, Matosinhos e Vila Nova de Gaia apresentarem uma cada vez mais robusta base produtiva que lhes permite oferecer crescentemente emprego aos seus próprios residentes. Ora, essa atração tem um enorme peso na mobilidade de fora para dentro da Cidade, mas é ela que alimenta por sua vez uma outra faixa de oferta de serviços e o emprego correspondente.
É difícil imaginar por que raio de espaços tem Pedro Duarte andado pela Cidade para alimentar tal ideia de que o Porto tem gente a mais e ligar isso à sua população residente. Aliás, essa posição é claramente contraditória com o argumento também apresentado por Duarte no debate de que existem 20.000 casas por ocupar na Cidade. Confuso e perplexo? Também eu estou, porque é difícil compreender como é que há gente a mais e casas não ocupadas.
A razão para este dislate é, a meu ver, outra. Pedro Duarte exercitou as suas “capabilities” partidárias em torno de questões políticas em sentido estrito. Falta-lhe miolo de pensamento sobre as questões urbanas e isso ficou claro como água pura nesse seu deslize de lógica de argumentação.
Se com este adversário, Pizarro não consegue finalmente uma vitória, então o melhor será voltar-se para outras ocupações.
Uma outra matéria muito interessante do ponto de vista da política urbana foi trazida pelo candidato do Bloco, Sérgio Aires, aliás numa intuição urbana de grande finura, contrastando as zonas da Foz e de Campanhã em termos de “horrores” pela construção em altura. Mas isso é matéria para uma outra crónica.

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