terça-feira, 7 de outubro de 2025

PARA LER E RELER COM EMOÇÃO

 


(Toda a gente já percebeu que nunca fui, não sou e nunca serei um ativista militante. Mas nas condições indecorosas de opressão dos palestinianos em Gaza e na Cijordânia e perante a cínica sobranceria de larga parte do mundo, incluindo a do mundo árabe, relativamente à desgraça dos palestinianos, o ativismo das flotilhas que se deslocaram para Gaza é, para mal do mundo, uma das únicas armas possíveis para furar o bloqueio do cinismo e indiferença do mundo e combater a opressão israelita. Foi essa avaliação que tentei transmitir no meu último post, desmontando a ideia patética de que esse ativismo estaria a prejudicar o inenarrável plano de paz que Trump orquestrou complacente e interessadamente com o seu amigo de coração Netanyahu. Grande parte do jornalismo internacional e nacional navega já no mesmo mundo da sobranceria e da indiferença. Por isso, quando do seio dessa moleza e passividade emerge alguma posição que se recusa a aceitar essa indiferença, ela tem de ser saudada com expressão, especialmente quando é redigida por alguém que tem experiência de terreno e que continua a manter amizade com gente que sofre em Gaza e na Cijordânia, resistindo sabe-se lá como, mas mantendo a dignidade e a lucidez, bens preciosos em território de escassez absoluta.)

Não sendo como disse um ativista, tenho um respeito profundo por gente informada sobre a tragédia de Gaza e da Cijordânia, que não perdeu os laços com esse sofrimento e que escreve implacavelmente contra essa opressão e contra a encenação de paz que grande parte do mundo está a orquestrar.

É esse o caso de Alexandra Lucas Coelho, jornalista e escritora, que assina no Público um notável artigo de opinião, enquadrando historicamente as sucessivas traições a que o povo palestiniano tem sido submetido, perante a massiva indiferença internacional. O artigo abala qualquer um e só esse abalo constitui um indicador da saúde da nossa sensibilidade. Se ninguém sentir nada ou ficar indiferente ao texto então está morto em termos de sensibilidade à tragédia humana. Essa indiferença possível dará razão a Alexandra Lucas Coelho quando refere que “o Holocausto ou Hiroshima/Nagazaki não são só repetíveis como podem ter sido prólogos” de algo que está a acontecer diante dos nossos olhos de hoje.

Lucas Coelho denuncia a paz podre do reconhecimento da validade de um plano de paz que parece ser mais “uma rendição da Palestina e um plano de negócios, uma versão 2025 das velhas partilhas coloniais”, existindo sempre “um Blair que diz que sim”.

Mas a verdadeira tragédia é a perceção de que para quem vive ainda o sofrimento monstruoso de Gaza, interpretado pelo amigo correspondente de Alexandra Lucas Coelho Sami, esse plano-rendição é a última alternativa de mitigação da morte e do sofrimento. Como diz Sami, por mais que nos impressione, “a prioridade é parar a morte”.

Assim está o mundo que estamos a deixar às gerações vindouras.

 

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