sexta-feira, 31 de outubro de 2025

SOBREVOO PELA POLÍTICA INTERNA

(A política interna está como a meteorologia por estes dias, cinzenta e enfadonha, aconselhando ao resguardo e a alguma bebida para animar as coisas. Parece indiscutível que as ideias e o comentário político estiveram por estes dias reféns das diatribes de Ventura e seus pares, tanto mais que o inexistente com prosápia vã Aguiar Branco permitiu sem decoro algum que o Chega ultrapassasse todos os limites em matéria de ética e educação parlamentares. O mais explícito tom taberneiro está instalado na Assembleia da República face à inconcebível invocação do direito da livre expressão do pensamento. Fora do Parlamento o estilo é conhecido. Um cartaz de implantação limitada basta para, com a ajuda preciosa das redes sociais, o Chega ocupar o espaço mediático, já que a grande maioria dos jornalistas mais indiferenciados são hoje meros animais amestrados, que reagem em modo pavloviano aos estímulos do animador-mor do reino. A comunicação de Montenegro ao país é um exemplo flagrante do que designaria de Entrudo institucional, anunciando uma insuportável onda do nacionalismo mais bafiento a propósito da lei da Nacionalidade, apresentada como o grande problema nacional de momento e canhestramente confundida com os problemas da imigração. A influência do Chega atinge o seu ponto máximo quando o próprio Governo acolhe um representante da sua animação permanente. Leitão Amaro vai à frente, provocando os danos maiores em termos de discurso político para depois Montenegro vir desempenhar o papel de putativo referente central do posicionamento entre o Chega e a oposição, por vezes algo envergonhada, do PS. E assim vamos caminhando pela bruma destes dias …)

Temos de convir que a tática do Chega está ajustada à debilidade dos seus recursos, praticamente limitados aos recursos histriónicos e discursivos de Ventura. De facto, não necessita de grandes investimentos discursivos para controlar os rumos da agenda mediática. Bastam pequenas incursões pelos exemplos do cartaz do “aqui não é o Bangladesh”, da rábula dos três Salazares e atoardas seletivas em torno da efabulação da imigração para que como marionetes bem manipuladas a discussão política se concentre nessas dimensões. E poderemos dizer que o Governo agradece pois esse foco do debate retira qualquer espaço à discussão do carácter malévolo da legislação laboral que está a ser gizada, dos ventos de controlo da despesa que se anunciam para o SNS sem que se vislumbrem soluções sólidas para os problemas dos últimos meses e para o flop em que as políticas de habitação do Governo estão a transformar-se (exceção feita à recente legislação sobre parcerias público-privadas para a transformação de edifícios públicos sem função em nova oferta de habitação, que merece a meu ver uma outra atenção).

O acompanhamento mimético das obsessões do Chega atinge agora no Governo a vertente do nacionalismo, completando o quadro.

No exterior desta agenda, o país político continua adormecido e esquivo em relação às grandes ameaças ao Estado de Direito que algumas iniciativas do Ministério Público têm vindo a protagonizar. Nem o Presidente da República, já em modo de desligar do motor ou em ponto morto, os partidos da oposição e personalidades ainda com algum peso de opinião se dignam acompanhar com VOZ o caso do juiz Ivo Rosa, o que nos fornece uma ideia algo preocupante do estado das coisas em matéria de defesa dos pilares da sociedade democrática.

 

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