domingo, 19 de outubro de 2025

TAMBÉM NA INOVAÇÃO A DIMENSÃO IMPORTA

 

              

(Recordo-me, com alguma saudade devo confessá-lo, que quando na FEP eu próprio e os Professores Mário Rui Silva, Mário Graça Moura e Argentino Pessoa introduzimos nas cadeiras de Crescimento Económico e de Economia da Inovação e do Conhecimento os modelos de Paul Romer sobre a inovação era frequente gerar-se uma discussão com os alunos mais afoitos e atentos sobre as implicações da medida dessa mesma inovação. A primeira reação que nos vem à cabeça é reconhecer na inovação uma dimensão qualitativa que Schumpeter, melhor do que ninguém, nos ajudou a compreender. Afinal a inovação não é mais do que combinar recursos existentes de diferentes maneiras, compreensão à qual a introdução das ideias de Romer veio trazer novas e aliciantes perspetivas. Mas quando para gerar essas novas ideias com valor económico potencial se têm de considerar as atividades de investigação e desenvolvimento e se compreende que isso exige a incorporação de investigadores, ou seja de pessoas com qualificações específicas, é possível intuir que as questões da dimensão de país não podem estar ausentes. Aliás, em alguns modelos de simplificação do pensamento de Romer, é possível chegar à constatação de que o esforço de investigação não pode ser desligado do potencial demográfico do país. O meu exemplo clássico era este: não esqueçam que 1% de engenheiros afetos a atividades de I&D não tem o mesmo significado na China e em Portugal. Em suma, a dimensão interessa, numa prática que nos parece ser, e é, fortemente qualitativa. Vem esta introdução algo saudosista a propósito de um artigo publicado na newsletter do Financial Times Free Lunch on Sunday a propósito do colosso de inovação em que a China está a transformar-se, não seguramente sem custos e com algumas apreensões no ar relativamente à sustentabilidade de algumas indústrias. Face a alguns desses resultados a que este post se refere, não podemos esquecer que, sem embargo das opções de política (autoritarismo do partido único) e de política económica subjacentes a estes resultados está a dimensão do país e a variável correlacionada do esforço de investigação e de alocação de capital humano para o concretizar. A dimensão importa. E não é apenas uma questão de pesos, de I&D no PIB ou de investigadores no emprego total. A massa absoluta de investigadores interessa e muito.)

O gráfico que abre este post ilustra bem o resultado do esforço de inovação do ponto de vista da liderança em alguns domínios industriais críticos. Mas em matéria de patentes registadas, que constitui um indicador imperfeito, mas que representa bem a questão dos “outputs” de inovação, a evolução da posição chinesa é assinalável.

É frequente ler-se a referência de que o esforço chinês é dificilmente replicável, dada a não usual dimensão do aparelho público chinês. O artigo de Tej Parikh é muito explícito em mostrar que o enorme esforço de subsidiação subjacente ao avanço chinês está a ser amplamente replicado nos EUA e na Europa, sem ignorar que o poder de comando do regime chinês se impõe como algo de dificilmente replicável. 

Mais interessante do ponto de vista crítico são as reservas quanto à sustentabilidade do avanço alcançado pelo esforço de inovação chinês. Os dados que o artigo documenta sobre a evolução da produtividade, medida sobretudo pela produtividade total dos fatores, uma aproximação grosseira à eficiência global da economia, não são propriamente auspiciosas. O mesmo se diga em relação ao registo da massa de empresas que está em terreno de prejuízos.

O estado da arte que resulta desta newsletter do Financial Times, regra geral bem documentada e informada sobre os assuntos que analisa, traz-nos ideias importantes. Ignorar os resultados do esforço de inovação, largamente potenciado pela dimensão da economia chinesa e do seu poder de vinculação das orientações de política económica, seria suicidário em termos de compreensão dos rumos da economia mundial. Mas também não é seguro afirmar que a extremamente ampla frente de inovação a que economia chinesa se abalançou seja toda ela bem-sucedida. Algo que os países mais próximos da esfera de influência chinesa estarão certamente atentos, mas igualmente uma oportunidade a monitorizar pela Europa, acaso alguma vez a União Europeia consiga gerar um modelo de decisão consistente em matéria de política de inovação.

 

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