(Milton Friedman)
(John Maynard Keynes)
Várias vezes neste blogue anotei a importância do debate económico que
passa pela blogosfera, sobretudo da americana, com relevo para as páginas ou
blogues de Bradford DeLong, Paul Krugman, Mark Thoma (Economist’s View), do VOX EU (este essencialmente europeu), David Glasner (Uneasy Money), Tim Duy FEDWatch, do PIERIA (essencialmente
inglês) e muitos outros. Talvez ingenuamente pensei que o Interesse Privado, Acção Pública pudesse assumir algum contributo
mais estruturado para o debate económico interno. Mas, estando ele limitado a
estes dois vossos servidores e com visitas sempre em número inferior para os posts de âmbito económico do que para os
de âmbito político ou mais geral, esse projeto está adiado, o que não deixa de
ser uma forma simpática de classificar a nossa ingenuidade.
Para quem como eu segue regularmente esta parte da blogosfera económica é
fácil perceber que este grupo se autoalimenta, citando-se ou criticando-se
reciprocamente, tirando partido do enorme poder de exposição e de comunicação
que revelam, pelo menos alguns dos ícones desta blogosfera (escrever no New York Times é obviamente uma
plataforma de enorme visibilidade. Mas, para além disso, o que temos é um
ambiente de debate com grande tradição de intensidade de gente que trabalha que
se farta, pois não deixa de produzir papers,
manuais e obras de grande divulgação.
E o que é impressionante é que esse debate persiste no chamado período de
férias. Sou um viciado destas coisas, não consigo afastar-me muito tempo do meu
Portégé que me comunica com o mundo e
mesmo com o Ipad perdido/roubado este
ano não fugiu à regra. Esta gente não afrouxa e não notei que alguma destas
colunas tivesse interrupção que se visse. E o que é mais relevante ainda é que
o debate esteve (ainda está) rico de cambiantes.
Vários temas saltaram neste último mês, com relevo particular para os temas
da política monetária e para os do crescimento. No âmbito do primeiro, emergiu um debate interessante em torno do pensamento de Milton Friedman, discutindo se
ele é ou não em termos monetários um keynesiano. O debate é um pouco técnico,
não o vou aqui reproduzir, mas prende-se sobretudo com o tipo de interpretação
a fazer de taxas de juro muito baixas (próximas de zero ou mesmo nulas, no
âmbito do que tem vindo a ser designado de “zero
lower bound”) ou muito altas. Regra geral, a que os keynesianos também se associam,
taxas elevadas e baixas são entendidas, respetivamente, como indicadores de
dinheiro escasso e fácil. A esta tese contrapõe-se a de Friedman segundo a qual
taxas elevadas e baixas são indicadores, pelo contrário, de dinheiro fácil (cheap money) e de dinheiro escasso (dear money). O que está aqui em causa é
sobretudo a questão de saber o que é que determina a procura de moeda e se as
taxas de juro nominais constituem um indicador credível do estado da política
monetária (apertada ou distendida). Sabe-se hoje que as taxas nominais de juro
não podem ser compreendidas isoladamente e que teremos de entrar em linha de
conta com as expectativas inflacionistas. Se estas forem muito elevadas então
no limite uma taxa de juro nominal muito elevada pode até indiciar estarmos
perante uma situação de dinheiro fácil ou barato. Ora, o que não podemos
ignorar é que, apesar dos receios ancestrais dos nossos amigos alemães, de expectativas inflacionistas estamos aviados e nada indica que tal panorama
venha a alterar-se significativamente nos próximos tempos.
Um outro debate intenso tem acontecido em torno da relação crescimento
económico- crises. A macroeconomia tendeu nos anos 80 e 90 (mais propriamente
na primeira metade desta década) a glorificar o crescimento económico,
trabalhando como se o ciclo económico tivesse desaparecido ou, pelo menos,
tivesse sido dominado pela “sábia” governação da política monetária. Apesar de
entusiasta das teses do crescimento endógeno, sempre nas minhas aulas alertei
para os perigos de sobrevalorizar a capacidade da ainda que sábia política
monetária dominar o ciclo económico e sobretudo para a errada compreensão do
capitalismo perdendo de vista a eterna relação entre crescimento económico e
crises. Na altura, a dificuldade consistia em comunicar aos alunos referências
sólidas sobre os perigos de ignorar a dimensão das crises do capitalismo. Ou o
teríamos que fazer recorrendo a economistas radicais de esquerda (na altura não
era fácil orientar alunos para a sua leitura) ou então teríamos que nos basear
em economistas como Krugman (de extrema relevância nesta matéria) que, desde
muito cedo e a partir da economia japonesa, começou a perceber que as crises
financeiras e de liquidez não tinham desaparecido.
O rumo das coisas acabou por dar razão à sagacidade de Krugman e outros. O
que parece ter desaparecido é o crescimento (endógeno) e as crises e o ciclo
económico estão aí de novo e a tão “sábia” política monetária afinal revelou-se
não tão sábia como isso, estando de novo no centro de debate. O melhor
indicador dessa viragem é o intenso debate sobre a sucessão de Bernanke no FED.
Acaso estivéssemos em mar clamo de política monetária e de ciclo económico a
sucessão passaria despercebida, o que não é o caso.
Mas, em simultâneo, os macroeconomistas parecem também despertar para um
outro problema que, esse sim, tem sido aqui repetidas vezes alertado neste
blogue. Trata-se de perceber se o capitalismo encontrou já, ou se permanece em
busca desse novo Graal, uma nova fonte para o seu crescimento de longo prazo. Robert
Gordon foi o economista americano que primeiro alertou para a distração do
verdadeiro problema que a crise de 2008 Lehman Brothers suscitou. Afinal, para
além dos seus problemas de recessão induzida por uma política económica pouco
decidida e excessivamente apoiada nos mecanismos monetários, a economia
americana estaria a debater-se com um esgotamento do efeito do progresso técnico
na produtividade. O debate, embora timidamente, tem vindo a alargar-se e ainda
recentemente o New York Times dedicou atenção ao tema do impacto reduzido das chamadas indústrias dos BIG DATA no crescimento. Alguns economistas têm referido que a internet e a sua grande
influência no desenvolvimento de atividades com processamento de informação
gigantesca poderá ser o tal impulso de crescimento de longo de que todos andam
em busca. Convém, porém, não perder de vista que a transformação de um fator de
impulso tecnológico em crescimento e em produtividade é muito lento como a história
económica da inovação tecnológica o demonstra. Está ainda fresquinho uma obra do nobel Edmund Phelps, Mass Flourishing, que talvez traga novas perspetivas ao tema.
A blogosfera económica não foi de férias, embora a temperatura a isso
convide.
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