Como Relvas cedo previu do alto da sua rara sagacidade, a morte de António Borges (AB) provocou o (nestas circunstâncias) habitual coro de elogios provenientes de todos os setores e quadrantes da vida nacional. Mas, e no que me toca, quero contra a corrente reafirmar que em quase tudo me afasto daquilo que AB foi em termos da expressão pública que mais visivelmente foi veiculando (convicções, escolhas, carreira); talvez com as duas únicas e honrosas exceções de sermos orgulhosamente oriundos da mesma cidade natal e titulares da mesma filiação clubista…
Não que AB não tivesse qualidades, como as de primar por uma grande inteligência e capacidade de trabalho e ser senhor de uma enorme afabilidade e urbanidade. Refiro-me, mais especificamente, à arrogante superioridade que invariavelmente exibia enquanto economista e académico, à obstinada rigidez que frequentemente demonstrava enquanto político e cidadão e à deriva interesseira que largamente evidenciou enquanto profissional e gestor. Retive na memória muitas das suas inconcebíveis declarações quando nos idos de 90 desempenhava a função de vice-governador do Banco de Portugal, tenho presentes as dúvidas de quem acompanhou de perto a sua passagem pelo INSEAD e pela capa da Fortune (que o tornou famoso à vista deste nosso provinciano retângulo), discordo de quase todas as suas proclamações políticas mais fortes (da profilaxia das falências ao choque fiscal, da redução dos salários à inevitabilidade do desemprego, da baixa da TSU à concessão privada da RTP) e achei pouco claras (ou até promíscuas) várias das suas incursões por terrenos dificilmente compatibilizáveis (professor e autor, administrador da Goldman Sachs, representante de hedge funds, analista e comentador, dirigente do PSD, responsável europeu do Fundo Monetário Internacional, gestor de empresas e assessor especial do Governo).
Dito isto, e sendo óbvio que a morte de alguém é matéria de pesar, o que pessoalmente mais me impressionou/sensibilizou quando assistia à peça da TVI que comunicava a notícia foi a crua lucidez que advinha das suas palavras de há meses, onde juntava uma clara perceção de finitude a um desiludido balanço de ação pública. Mesmo por parte de quem, como eu, entenda que um maior contributo de AB ao país teria sido provavelmente mais nefasto do que positivo – elegantemente, como é seu timbre, o António Figueiredo escolheu falar apenas de desconformidade, eu preferiria referir os riscos de um perigoso radicalismo fundamentalista –, justo será que aqui venha também prestar homenagem àquele momento profundamente doloroso de um ser humano tão dignamente mergulhado na consciência de uma já irremediável autoavaliação…
Não que AB não tivesse qualidades, como as de primar por uma grande inteligência e capacidade de trabalho e ser senhor de uma enorme afabilidade e urbanidade. Refiro-me, mais especificamente, à arrogante superioridade que invariavelmente exibia enquanto economista e académico, à obstinada rigidez que frequentemente demonstrava enquanto político e cidadão e à deriva interesseira que largamente evidenciou enquanto profissional e gestor. Retive na memória muitas das suas inconcebíveis declarações quando nos idos de 90 desempenhava a função de vice-governador do Banco de Portugal, tenho presentes as dúvidas de quem acompanhou de perto a sua passagem pelo INSEAD e pela capa da Fortune (que o tornou famoso à vista deste nosso provinciano retângulo), discordo de quase todas as suas proclamações políticas mais fortes (da profilaxia das falências ao choque fiscal, da redução dos salários à inevitabilidade do desemprego, da baixa da TSU à concessão privada da RTP) e achei pouco claras (ou até promíscuas) várias das suas incursões por terrenos dificilmente compatibilizáveis (professor e autor, administrador da Goldman Sachs, representante de hedge funds, analista e comentador, dirigente do PSD, responsável europeu do Fundo Monetário Internacional, gestor de empresas e assessor especial do Governo).
Dito isto, e sendo óbvio que a morte de alguém é matéria de pesar, o que pessoalmente mais me impressionou/sensibilizou quando assistia à peça da TVI que comunicava a notícia foi a crua lucidez que advinha das suas palavras de há meses, onde juntava uma clara perceção de finitude a um desiludido balanço de ação pública. Mesmo por parte de quem, como eu, entenda que um maior contributo de AB ao país teria sido provavelmente mais nefasto do que positivo – elegantemente, como é seu timbre, o António Figueiredo escolheu falar apenas de desconformidade, eu preferiria referir os riscos de um perigoso radicalismo fundamentalista –, justo será que aqui venha também prestar homenagem àquele momento profundamente doloroso de um ser humano tão dignamente mergulhado na consciência de uma já irremediável autoavaliação…
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