A República Socialista do Vietname, a República Democrática Popular Lau e o Reino do Camboja são países onde impera uma forte inspiração política chinesa. Com a não irrelevante diferença de que o Camboja se tende a apresentar mais democrático – talvez fruto das marcas deixadas por décadas de carismática liderança/presença de Sihanouk e, ainda, da dimensão traumática provocada pelos khmers vermelhos – como uma monarquia constitucional e parlamentarista.
Pois aquele domingo em que aterrei em Phnom Penh era dia de eleições legislativas, as quintas desde que as mesmas foram instituídas em 1993 sob o alto patrocínio das Nações Unidas. O bizarro Hun Sen e o seu Partido do Povo Cambojano são poder há já vinte anos ao terem vencido com facilidade as primeiras quatro edições eleitorais – da última vez, ao que parece, com uma enormíssima chapelada que resultou na sua obtenção de 90 dos 123 lugares que compõem a Assembleia Nacional –, mas naquele fim de tarde os facebooks oposicionistas aventavam a possibilidade de uma surpresa para o ruling party e a guia que nos levava ao hotel não parava de receber e enviar mensagens escritas e não escondia uma grande excitação/emoção.
O líder da oposição, Sam Rainsy, tinha sido impedido de se candidatar pelo Partido de Salvação Nacional e acabava de acusar frontalmente Hun Sen de “cobarde”, enquanto o anúncio dos resultados preliminares era rapidamente antecipado (68 eleitos pelo PPC contra 55 pela oposição) e se multiplicavam as acusações de irregularidades e fraudes variadas e as convocatórias para protestos. No dia seguinte, as forças pró-governamentais adocicavam a pílula com o reconhecimento da necessidade de mais reformas e de mudanças de estilo e as forças oposicionistas aumentavam a tensão com declarações de não-aceitação do veredito e exigências de investigação e novas comprovações. Mas o mais impressionante de tudo era a reação dos cidadãos que – semana fora de dedo indicador direito impregnado de tinta a assinalar a sua ida ao voto – se mostravam generalizadamente convictos de uma nova batota mas defensores de a ressalvar em nome de um interesse nacional superior de não confrontação e preferindo sublinhar que um passo importante já tinha acontecido ao passar a haver uma voz parlamentar diferente com peso significativo – o tempo asiático é mesmo o do longo prazo!
Termino esta incursão indochinesa com uma confissão – cedência que, espero bem, o António Figueiredo me perdoará… Não é que recuperei nesta viagem, ainda que em novos moldes, a sequencial lógica desenvolvimentista que Rostow há muito tentara impor! Eis, então, os novos termos dessa renovada ideia etapista: a diversidade dos estádios de desenvolvimento em que se encontram os quatro países da Indochina pode ser claramente aferida pelos respetivos índices de motorização, largamente observáveis nas suas estradas e ruas (tipologia de veículos, utilização de capacetes, densidade de trânsito, intensidade da poluição no ar). Concretizando, numa versão naturalmente simplificada: o Laos é mais calmo e movido a butes ou de bicicleta, no Camboja impera a motocicleta para todo e qualquer serviço de transporte individual, familiar e de mercadorias indiscriminadas (4 milhões de motociclos para uma população de 16), no Vietname ainda dominam os veículos motorizados com duas rodas mas o seu nível qualitativo médio é nitidamente mais sofisticado, na Tailândia o automóvel arrasa e o tráfego é infernal. Quem diria?
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