Do ponto de vista político, nem a festa do Pontal, nem a alergia
constitucional do primeiro-Ministro alteraram substancialmente a modorra
estival em que estamos sonolentamente envolvidos. Não me lembro de pré-campanha
para as autárquicas mais sensaborona do que a que temos vivido, tudo isto
apesar de bomba constitucional que pode ocorrer, mas a minha intuição é que
muito provavelmente o Tribunal Constitucional não irá por aí, deixando à
Assembleia da República o ónus futuro de clarificar este preceito. Só espero
que o TC não vá em trade-off´s ou
equilíbrios e que analise as questões que tem em mãos (mandatos municipais e aferição
da constitucionalidade de medidas governamentais pré-orçamentais) em função da
mais rigorosa interpretação constitucional, ignorando por isso as consequências
das suas decisões, o que não significa como é óbvio que a decisão não seja
contextualizada.
A desvalorização visível do interesse pelas autárquicas tem várias explicações
possíveis. Uma dessas interpretações prende-se com a desvalorização do local
face ao peso do quadro nacional de indefinições e de falta de rumo do processo
de ajustamento. Isto não significa que o significado do local não seja intenso
neste contexto de ajustamento, pois grande parte da almofada social dependerá
da margem de manobra que os municípios tiverem para exercer essa função e de
saber se os municípios estão prontos e recetivos às escolhas públicas que a
operacionalização dessa almofada exige. Mas apesar de alguma mediatização que
emerge, sobretudo para os casos mais renhidos de disputa eleitoral autárquica,
a gravidade do momento nacional sobrepõe-se em termos de visibilidade mediática.
Afinal, a crise de ajustamento atingiu indiferenciadamente o território nacional.
Do pouco que vai sendo antecipado sobre os programas eleitorais autárquicos,
este tipo de questões parece ausente. Pressente-se que os candidatos falam mais
assiduamente em questões sociais, mas do ponto de vista mais concreto e
operativo parece longe a possibilidade de uma frente política local que
interpele o governo central a um pacto mais sistemático sobre condições de
descentralização e transferência correspondente de meios financeiros das políticas
sociais.
Aliás, depois do impulso “Rélvico”, a maioria permanece num vazio enorme
sobre as questões da descentralização, não parecendo existir nenhum plano B
para a não constitucionalidade da legislação sobre comunidades intermunicipais.
Com toda esta modorra, só interrompida pela trágica saga dos fogos em
Portugal e pela trágica má sorte de bombeiros que pagam com a vida a
desorganização de uma floresta agonizante, só a novela SWAP parece afinal não
ter fim, apimentando esta acalmia. E o que mais pode vir a acontecer sobre esta
matéria! Desta vez, pelos vistos dando seguimento a uma lei escrupulosa de não
entupimento de arquivos, a insuspeita Inspeção-Geral de Finanças terá destruído
material que reuniu no âmbito da atividade inspetiva em 2008 sobre SWAP. Esta administração
pública portuguesa é uma caixinha de surpresas. Ou deixa arquivos sem conta ao
deus dará ou então inventa regras segundo as quais “os processos de controlo no âmbito do Sector Empresarial do Estado
mantêm-se na fase ativa durante três anos, período durante o qual se mantêm os
papéis de trabalho”. Estaremos mal de arquivos?
Apesar destes fatores de apimentação, a verdadeira discussão permanece por
fazer: quais são os limites que a gestão pública deve respeitar, sobretudo em
termos de mecanismos de financiamento? O rescaldo do “new public management” está por fazer, por muito que custe a quem o
trouxe para a gestão pública, neste caso sequelas da “Blairite” que tocou muita
gente.
Sem comentários:
Enviar um comentário