quarta-feira, 28 de agosto de 2013

TEMAS SÍRIOS



Ontem, ao princípio da noite, dei conta que o browser de internet do meu Portégé se recusava a conectar-se com a página do New York Times, uma das minhas favoritas e na qual tenho aliás uma assinatura digital. Tentei e tentei de novo, despenteei o Firefox mas nada. Tentei noutro portátil caseiro e nada. Mudei de browser e nada. Imaginei que algo se passava, manutenção, reestruturação do site, vá lá saber-se.
De manhã, já no desktop do escritório tentei e o site estava acessível, mas através do portátil, nem sombra do NYT. Procurei referências e verifiquei que alguns Iphones também não conseguiam aceder ao site. Só depois confirmei via notícia do Público, que o site do NYT tinha sido alvo de um ataque de “hackers”, tudo indica de um exército eletrónico sírio, que deve ter destruído endereços e suscitado o caos. Ainda não consigo aceder via portátil, o que sugere estragos significativos numa das páginas mais visitadas do mundo.
Este presumido ataque (eletrónico) sírio a um dos bastiões americanos interpretei-o como um sinal de que não podia deixar de referir-me à questão síria e ao de novo ambiente belicista que está no ar, depois do impacto das imagens e notícias sobre a mais que provável utilização de materiais químicos no hediondo gaseamento de civis nos arredores de Damasco pelas forças de Assad.
A minha reflexão balança entre reconhecer que a selvajaria do exército de Assad é insustentável e que é necessária uma intervenção qualquer e hesitar na avaliação dos efeitos regionais e locais que uma intervenção, por mais contida que se apresente, tenderá a provocar. John Cassidy assinou ontem na New Yorker uma crónica também balanceada sobretudo na avaliação das forças que vão movimentar-se em torno de Obama para impulsionar a “desejada” intervenção. George Packer, também nessa revista, vai no mesmo sentido.
E neste balanceamento não pode deixar de pesarem algumas ideias. Em primeiro lugar, as imagens que circularam remetem-nos estranhamente para memórias horrendas da 1ª guerra mundial, equivalem a um estádio sórdido da maldade humana. Por outro lado, tudo indica que o gaseamento terá sido um indicador de completa destruição de cadeias de comando, fenómenos que regra geral acontecem em períodos de derrocada de regimes e de poderes absolutos. E, para cúmulo, o belicismo ocidental emerge sobretudo em personalidades políticas que estão, senão encostadas à parede, pelo menos acorrentadas a situações internas ou sem saída ou francamente abaixo de expectativas que criaram. Vejamos. Cameron precisa de um “ataquesinho” para recuperar a dianteira. Hollande, coitado, em plena subida de impostos, assume uma França bélica como se isso pudesse tapar o sol com uma peneira. Obama, enfraquecido por demais com as questões de espionagem de dados e com a invasão descarada da privacidade, necessita também de um argumento externo para “amenizar” a onda securitária em que se deixou envolver.
E, se não bastasse, há a experiência traumática do Iraque. Não estou a sugerir que a falsidade de informação que esteve na base dessa invasão tenha aqui um remake numa ofensiva contra a Síria. Mas há seguramente a experiência que decorre do facto do belicismo tender a subvalorizar efeitos das intervenções e a fazer uma má avaliação do contexto dinâmico das intervenções.
Por isso, o meu balanceamento existe e penso que não estarei sozinho nessa avaliação.

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