Em alguns posts anteriores tenho
tentado chamar a atenção para a ocorrência de fenómenos sociais que, regra
geral, não são apontados como efeitos diretos da crise que vivemos mas que
começam a emergir como regularidades, sobretudo à medida que a pesquisa económica
e social começa a tratar dados relativos ao período posterior a 2007. Algumas
dessas regularidades extravasam a situação particular da crise portuguesa e
transportam-nos para similaridades comparativas com situações empíricas que não
imaginaríamos tão reais.
Trago-vos hoje um fenómeno bem conhecido das famílias portuguesas, mas que
curiosamente é identificado numa sociedade que julgaríamos imune à sua incidência,
pelo menos em nome dos mitos que tendemos a acumular sobre a sociedade
americana, pois é de pesquisa recente nos EUA que estou aqui a invocar.
O tema surgiu-me através dos Blogues de Berkeley, neste caso de um artigo publicado pelo sociólogo americano Claude Fisher em fins de julho, o qual por sua vez traz para a ribalta do comentário um interessante artigo dos demógrafos americanos Joan Kahn, Frances Goldscheider, and JavierGarcía-Manglano.
O tema é nada mais nada menos do que a tendência crescente na sociedade
americana para adultos jovens viverem cada vez mais com os pais e dependerem
cada vez mais do rendimento desses mesmos pais. Essa percentagem que não cessou
de descer até 1980, tem aumentado persistentemente a partir daí, atingindo em
2010 a quota de 17% (em relação ao total de jovens adultos dos 25 aos 44 anos
na sociedade americana). 48% desses jovens adultos em 2010 dependiam
economicamente dos pais, o que consagra uma evolução extremamente rápida face a
períodos anteriores.
Claude Fisher fecha o seu post com a seguinte interrogação: “What will happen
when the young Americans who now depend so much on their elderly parents
themselves become elderly parents?” (o que acontecerá quando os jovens americanos
que agora dependem dos pais se tornarem eles próprios em pais envelhecidos?).
Temos aqui não só um dado mais sobre a progressiva desigualdade da
sociedade americana, mas também uma evidência de similaridade de comportamentos
com sociedades que teríamos dificuldade de comparar com a portuguesa. Afinal, o
tal mito da liberdade individual americana, terra de todas as esperanças e do
empreendedorismo, parece hoje longe dos tempos gloriosos de outrora.
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