(A poucos quilómetros da Espanha galega e onde gastronomia
inimitável e enchimento do depósito é combinação natural e quase quotidiana, a
greve dos combustíveis não tem para mim o impacto que teria se estivesse
localizado por estes dias no Porto, apesar das deslocações a essa mesma cidade
por motivos familiares. O conforto do contexto não me inibe de refletir sobre as inúmeras questões
que o afrontamento entre o sindicato dos motoristas que transportam matérias perigosas
e a ANTRAM suscita.)
A incomodidade que esta greve acarreta não
tem um impacto homogéneo no território nacional e cabe-me neste caso reconhecê-lo
com vantagem. A Espanha galega é aqui ao pé e o transfronteiriço é neste caso
uma dimensão de conforto e segurança.
Mas a greve dos motoristas que transportam
matérias perigosas anuncia grandes mudanças no sindicalismo contemporâneo, cavando
ainda mais fundo a queda do sindicalismo mais tradicional, seja ele organizado a
partir da influência da CGTP e do PCP, seja ele mesmo afiliado com a
UGT. O traço mais marcante desta mudança é a quase nula perspetiva política com
que tal sindicalismo é conduzido, o que não é coisa pouca na formação dos
processos que conduzem a este tipo de greves mais extremas. Para além da figura
mais ou menos sinistra do advogado que representa e, na prática, comanda a
estratégia deste peculiar sindicato, a greve em causa perdeu irreversivelmente
a compreensão da opinião pública a partir do momento em que ficou publicamente
claro que ela estava a ser conduzida como aproveitamento estrito e de última
instância do momento eleitoral. Mas, além disso, a estratégia do sindicato é
totalmente errática, sendo difícil ao cidadão que precisa do combustível para o
seu trabalho compreender uma greve que versa sobre acordos a prazo, quando a negociação
do curto estava já plenamente assegurada. Parece-me ainda que a direção da
ANTRAN já não coincide com a perspetiva recuada e passadista com que alguns
empresários dos transportes ainda encaram a relação salarial, o que também
contribui para a total impopularidade da greve.
Como se previa e justificava o Governo partiu
para o problema com uma visão mais musculada do que a assumida na última greve
e, se mantiver o tom de firmeza que tem enunciado ganhará inequivocamente a
opinião pública, ganhando de barato mais uma alavanca eleitoral, sobretudo em
tempos em que o verão tem evoluído ameno.
Mas o que parece evidente neste caso e que
alguma esquerda se recusa a entender, há domínios da atividade pública e
coletiva em que os Governos estão obrigados a ponderar o respeito pelo direito constitucional
à greve e também a preservação do interesse coletivo e do bem-estar público. Pela
sua influência estratégica em praticamente todos os setores de atividade, os
combustíveis representam um setor em que a proteção dos direitos dos trabalhadores
tem de ser combinada com a defesa do bem público, sobretudo quando não está em
causa qualquer manifestação lesiva de direitos básicos desses mesmos trabalhadores.
Pode Pacheco Pereira bem espingardear com as suas ressalvas de que o direito à
greve estará a ser comprometido que neste caso não tem razão, pois esta é uma
das situações em que esse direito tem de ser confrontado com outros direitos
constitucionais.
Isto não significa como é óbvio que, no calor
da refrega, não possa haver algum descuido ou intervenção errada de alguma
autoridade que possa virar as coisas em sentido contrário. Por isso, ou em plenários
de trabalhos há este sábado um recuo tático ou poderemos ter períodos prolongados
de resistência, com aumento de tensão que é sempre uma situação de efeitos indeterminados.
Notas à
margem
Tenho nestas férias me imposto a obrigação de
andar um número considerável de quilómetros. Nas minhas andanças por Seixas e pelo
seu interior é fácil confirmar o volume elevado de capital residencial que se
encontra à venda e contam-se pelos dedos os novos projetos imobiliários. Além
de que algumas belas peças do capital residencial desta zona já viverem melhores
tempos e revelam significativos sinais de ruína, descuido, incúria ou simplesmente
falta de graveto ou de interesse. Quer isto significar que esta parcela do Alto
Minho já viveu melhores dias em termos de atratividade residencial mesmo que a
nível de segunda residência. Há por aí muito autarca que pensa que a atração da
segunda residência não é a praia das suas ambições e que pensa que essa gente
se safa por si, não exigindo atenção especial. Engana-se e a economia local rapidamente
lhes mostrará que essa é uma posição errada e de vistas curtas. O Alto Minho é
uma sub-região em que a sua posição de competitividade enfrenta a ameaça do
declínio demográfico. Ou seja, o Alto Minho começa a partilhar algumas características
económicas da aglomeração metropolitana e da extensão industrial do Ave-Cávado,
mas em termos demográficos nem por sombras está próximo desses territórios. A atração
de residentes deve por isso constituir uma prioridade da intervenção pública, o
que obviamente não implica nem desconsiderar nem desproteger os já residentes e
nativos.
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