(Moledo e Seixas estão no ponto. Temperatura amena, vento
a não transpor o limiar da incomodidade, a gastronomia da D- Rosinha na Gaivota
cada vez mais fiável, as tias queques da Foz e de Lisboa ainda a pairar pelos Algarves,
tempo para usufruir da casa de Seixas da qual as contingências da vida me têm
afastado mais do que o esperado. Tempo para leituras diversas e sobretudo o gozo particular
de um ritmo de vida mais saudável.)
Moledo e Caminha beneficiam, paradoxalmente, por
agora de um declínio de procura que torna tudo mais fácil, situando a população
volante em limiares mais compatíveis com as infraestruturas existentes. Os “habitués” já estão por cá e isso ainda
que não pareça faz parte da sensação de fazer parte de uma tradição. O Rui Feijó
iniciou há pouco residência permanente em Moledo, na sua nova casa, renovada de
um edifício já existente. O Manuel Matos e o Jorge Pinho de Sousa do INESC TEC
já pairam pela praia e imediações e já fazem parte do “povoado”. Outros rostos
conhecidos já se passeiam por aqui, reconheço-os, embora não faça a menor ideia
da sua identidade, mas é agradável regressar às identidades do lazer.
Ontem, fiz seis quilómetros a pé de casa à
praia e pergunto-me por que raio de razão no dia-a-dia de todos os dias me falta
força de vontade para o fazer com mais regularidade, respondendo às exigências
médicas de fazer descer o nível da glicémia para níveis mais compatíveis com os
padrões recomendados. Vou certamente repetir e merece destaque a nova ecovia
entre a praia de Moledo e Vila Praia de Âncora, a infraestrutura certa para andar
a pé ou de bicicleta com os olhos grudados numa paisagem ímpar com o mar, Santa
Tecla e a Ínsua a disputarem a primazia do olhar.
A ideia de oásis, extensiva a um ocidente em
que democracia não é palavra vã, veio-me à cabeça depois de ler hoje de manhã
uma reportagem do El País Semanal sobre o vale de S. Joaquim na Califórnia, em
que o potencial de exportação americano de tudo que é tomate, amêndoa, vinho,
frutas diversas e legumes se alimenta de cerca de 90% de mexicanos ilegais que
cruzam a fronteira (cada vez menos ao contrário do que as fake news de Trump nos sugerem). A reportagem é brutal sobre as
condições a que a agricultura intensiva está a submeter aquele solo, com o ar preenchido
de pesticidas e temperaturas insuportáveis. Mas é também brutal pelos atentados
despudorados à democracia que são no dia-a-dia perpetrados pelos serviços americanos
de controlo da imigração legal e que me faz pensar como é triste não termos
Roberto Bolaño vivo para denunciar com a sua pena mortífera estes atentados ao
mais vulgar sentimento de humanidade.
Não posso também deixar de pensar no quantum
de irracionalidade que é permitir o avanço da agricultura extensiva no Alentejo
da área de influência do Alqueva, só viável com as empresas de mão-de-obra de
Hong-Kong e outras paragens a trazer nepaleses e outras nacionalidades em massa
para vir cumprir, sabe-se lá em que condições, a safra da colheita.
E, obviamente, pensar como o respeito mais elementar
pela democracia e suas regras de humanidade vai criando oásis num mundo
devastado pela destruição massiva desses valores.
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