(Algo
desapercebidas no lio em que a situação política espanhola se transformou, as
eleições regionais na Galiza representam uma espécie de paradigma replicante
das eleições gerais, com a
diferença substancial de que a governabilidade não está neste caso em causa)
Pelas piores razões,
ditadas pelo acidente observado no Celta, o depauperado comboio que faz as
ligações entre Porto e Vigo, a Galiza emergiu de novo nos radares da imprensa
nacional, anulando qualquer referência às eleições regionais que terão ligar
este mês de setembro, lá para o fim. A tragédia do
acidente de Porrinho, para além do infortúnio tráfico dos mortos e feridos
provocados pelo acidente, é não só uma derrota das autoridades nacionais de
Espanha e Portugal que continuam a manter a linha nas condições de insegurança
agora manifestadas, mas também de todos os que precocemente anunciaram que a
modernização da linha Porto Vigo estava assegurada. Recordo-me de neste blogue
alertar para a distância imensa que existe entre os textos das declarações das
cimeiras ibéricas e a triste realidade do investimento público que deveria vir
a elas associado em termos de programação. Para maior tragédia circunstancial,
o Celta circulava naquele dia entre Vigo e Porrinho com cerca de 70
passageiros, que é quase o triplo da frequência média observada naquele troço
da ligação em território galego. Entre os mortos, contava-se paradoxalmente um
turista americano, provavelmente dos que continua a considerar que aquela ligação
internacional deve continuar a existir como serviço público ao serviço do
relacionamento inter-regional e transfronteiriço.
Com o alarido do
acidente, as eleições regionais galegas passaram para uma penumbra de quase
anonimato. E é pena porque elas têm significado acrescido, sobretudo porque
acontecem no meio de mais uma crise investidura para a governação central em
Espanha, provavelmente a caminho de terceiras eleições, as quais, a
realizarem-se, anunciam forte abstenção dos galegos.
O sempre controverso
Xosé Luís Barreiro Rivas, professor de ciência política na Universidade de
Santiago de Compostela, com o qual privei em algumas conferências e eventos da
cooperação transfronteiriça animada pelo Eixo Atlântico, assina hoje na edição digital da Voz de Galicia uma sugestiva crónica sobre a divisão que se
manifesta na região entre o PP e uma amálgama de forças políticas que pretendem
apear da governação Nunes Feijó e o PP. O termo amálgama aplica-se como uma
luva, pois o conjunto político formado pelo movimento das Mareas, de
representações do PODEMOS, do Partido Socialista Galego (PSG) e do Bloco
Nacionalista Galego (BNG) não tem ponta por onde se lhe pegue em termos de
convergência na ação. Não me espanta que o apoio a Nunes Feijó se paute pela
aposta na estabilidade e na manutenção da ordem institucional, até porque Feijó
está menos tocado pelos salpicos da corrupção no PP do que o próprio Rajoy e
tem líderes galegos com grande peso como a ex-ministra Ana Pastor, hoje
presidente do Congresso de Deputados, representantes de um PP mais
institucional e menos sujeito aos arrivismos dos deslumbrados pelo poder e pela
sedução dos “cartos”.
De certo modo, a Galiza
representa uma réplica da situação política espanhola, onde o PP continua a ser
o país mais votado mas uma larga coligação negativa está apostada, algo
suicidariamente em meu entender, em evitar que o PP governe mesmo que em
minoria. Mas há uma diferença substancial, tudo indica que a larga coligação
negativa não impedirá o PP de Feijó obter uma maioria absoluta mesmo que à
tangente, ao mesmo tempo que o PSG se afunda para limiares impensáveis e o BNG
quase que desaparece do xadrês político regional. Não acredito que os
resultados das eleições regionais na Galiza tenham efeitos que se vejam nas mais
que prováveis eleições nacionais, nas quais o PP parece poder reforçar a sua
votação, ainda que muito ligeiramente. A registar-se alguma influência, admito
que o afundamento do PSG possa projetar no PSOE os riscos de manter a posição
de impedir a governabilidade conduzida pelo PP. Paradoxalmente, há sondagens
que evidenciam o que o jovem líder do PSOE está a aumentar os apoios internos
do seu partido à sua posição de inviabilizar qualquer solução governativa. Há
duas interpretações possíveis para estes 50% de apoio à ingovernabilidade. Por
um lado, o PP tem feito tudo para alimentar a rejeição da governabilidade. A
indicação do ex-ministro da Economia Soria, fortemente salpicado pela
corrupção, para o Banco Mundial é um exemplo de manual de arrogância política.
Mas, por outro, podemos ter aquele efeito tão conhecido e humano de, face ao
abismo, a união fazer a desgraça parecer menos dura. O PSOE está em maus
lençóis e creio que de Espanha virão ventos amortecidos da mudança política que
António Costa desejaria para as economias do sul.
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