É tremenda a velocidade com que a maioria da nossa gente adere aos encantos das capacidades mediáticas, dos discursos fáceis e das presenças pueris. Não quero com isto dizer que o Presidente da República seja destituído de espessura própria (ao invés, até em comparação com a completa ausência de dimensão do seu inconcebível antecessor) ou um ingénuo da política (ao invés, até em comparação com as aflitivas fraquezas do seu correligionário Passos). Quero, isso sim, sublinhar quanto considero pertinentes as duas chamadas de atenção que lhe foram dirigidas num curto espaço de tempo por Eduardo Paz Ferreira e José Pacheco Pereira – remeto para a entrevista do primeiro ao “Jornal i” (acima) e para um excerto das eloquentes palavras do segundo na primeira “Quadratura do Círculo” desta nova temporada (abaixo).
“Eu tenho uma opinião crítica da atuação do Presidente da República. (...) Mas a prática quotidiana de somar declarações sobre declarações sobre tudo quanto há é, do meu ponto de vista, má. É má para o Presidente, é má para a governação e é má para o sistema político. Porque eu não concebo um Presidente que faz uma espécie de comentário permanente sobre matérias que inclusive não são do âmbito da sua competência – matérias de governação, de pura governação (...). Eu não concebo uma Presidência, que tem obrigação de ter alguma reserva, a fazer um comentário contínuo sobre tudo o que se passa. As pessoas agora acham muita graça a encher os noticiários no mês de agosto, e vai encher os noticiários ainda durante algum tempo, mas é pernicioso para a saúde do nosso sistema político. (...) Ele comenta tudo, tudo no próprio dia, todas as matérias, nacionais, internacionais, primárias, secundarias, terciárias... As pessoas dizem ‘ah, faz isso num clima de afetos, de proximidade com as pessoas’ – não, dá sempre torto e é só uma questão de tempo. E eu acho que é mau para a relação entre a Presidência e o Governo – neste momento até é bom para o Governo, mas isso para mim, do ponto de vista institucional, não me parece aceitável, quer dizer, por muito que o Governo goste há de haver uma altura em que ninguém vai gostar, nem o Presidente da República vai gostar, vai ter de estar calado nalgumas matérias e, quando tiver um silêncio, esse silêncio ressoa muito mais. Por outro lado, desvaloriza a sua própria palavra. (...) Já começa a haver uma desvalorização da palavra presidencial e, acima de tudo, uma espécie de meta discurso – quer dizer, o Presidente da República não é hoje um comentador político, o lugar de onde fala não é o lugar de um comentador político e, desse ponto de vista, tem que ter reserva na sua atuação, está a falar demais. (...) Ele está a criar uma cama em que ele se vai deitar mal porque isto não vai ser sempre assim. A gente percebe as grandes linhas e eu não acho mal que a gente perceba quais são as grandes linhas – ele entende que, a prazo, tem que haver um entendimento entre o PSD e o PS, para haver esse entendimento tem que se afastar Passos Coelho, a gente percebe a estratégia do Presidente. (...) Mas não pode viver sempre em Presidência aberta, porque viver sempre em Presidência aberta é uma interferência indevida no funcionamento das outras instituições.”
Cuidado, muito cuidado!
(António, http://expresso.sapo.pt)
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