(Fonte: OECD Employment Outlook 2007, p. 161)
(Andou por aí um
alarido generalizado sobre o comportamento sindical na Auto Europa como se a multinacional,
apesar da sua importância vital para o país, fosse intocável; quanto a mim, parece-me que há gente que
ainda não compreendeu o que é uma economia de mercado moderna e a que barganha sindical
faz parte dessa modernidade, por muito que custe a alguns saudosistas de um
mundo em que as greves seriam proibidas em nome não se sabe de que interesse, talvez
do interesse nacional capturado…)
Claro que o alarido em torno
da Auto Europa foi largamente apimentado pela sugestão de uma luta intestina
entre o sindicato que veio a terreiro e a demissionária Comissão de Trabalhadores.
Afinal, o sindicato seria afeto ao PCP e a demissionária Comissão de Trabalhadores
tinha reconhecidamente uma forte implantação do Bloco de Esquerda. A narrativa
estava montada: as desavenças à esquerda mostrariam uma geringonça capaz de
sacrificar o interesse nacional em troca do conflito sindical, ou seja a luta
intestina entre a barganha salarial descentralizada ao nível do posto de trabalho
versus a barganha ao nível da representação sindical. Essa narrativa ignorava
escandalosamente um facto, os trabalhadores não são personagens destituídos de
discernimento e estão no seu direito de se recusar a trabalhar ao sábado, pelo menos
sistematicamente.
Cada vez mais a
investigação disponível mostra que o ativismo sindical é crucial para proporcionar
uma relação mais equilibrada entre capital e trabalho, manifestamente alterada a
favor do primeiro nos últimos dez anos. Certamente que nos convém uma Auto Europa
dinâmica e investidora e que qualquer risco de deslocalização da fábrica de
Palmela teria efeitos devastadores sobre a balança externa portuguesa e sobre
as condições de vida de uma massa muito significativa de trabalhadores. Mas não
acredito que a sua experiência os trabalhadores da Auto Europa se deixem
apanhar e ludibriar por questões de protagonismo mediático ou por falsas ilusões
de conquistas de novos direitos.
Ainda há dias, num
artigo de Lawrence Summers comemorativo do Labour’s Day nos EUA (link aqui), e Larry não é
seguramente um perigoso esquerdista ou um comunista convicto, o economista americano
se insurgia contra a perda de poder negocial do mundo do trabalho. E concluía
que o restabelecimento de uma relação mais equilibrada entre o capital e o
trabalho só poderá ser conseguido com um recrudescimento do poder de barganha
no mundo do trabalho e da empresa, o que exigirá que o sindicalismo recupere
forças e o seu universo de representação.
Sabemos que a chamada
densidade sindical, que mede a percentagem de trabalhadores empregados inscritos
numa organização sindical, é muito baixa em média nos países da OCDE, 17%,
embora substancialmente mais elevada entre os países escandinavos e
substancialmente mais baixa entre os países do leste europeu entretanto seduzidos
pela economia de mercado. Para além disso tem vindo a baixar sustentadamente ao
longo do tempo, sobretudo entre 1985 e 2015. Os números do mais recente
Employment Outlook OCDE (2017) são esclarecedores.
A situação portuguesa é
no contexto europeu preocupante. O poder de representação dos trabalhadores é
um dos mais baixos (ver gráfico inicial) e estamos com os países de mais baixa
densidade sindical (Hungria, Lituânia, Polónia, Turquia). Más companhias em
termos de proteção do mundo do trabalho.
Como é óbvio, os números
de Portugal não são seguramente o produto de uma falta de confiança no poder de
representação que os sindicatos oferecem. Em meu entender, não são tanto os
casos tipo Auto Europa que estão na origem desta tão baixa densidade sindical. Talvez
mais casos como o do Sindicato dos Enfermeiros ou dos Professores nos seus
momentos de maior delírio. Os números de Portugal são o reflexo das transformações
observadas no mundo do trabalho, desfavoráveis aos trabalhadores. Certamente
também que a barganha descentralizada protagonizada pelas Comissões de Trabalhadores
do tipo da demissionária na Auto Europa é crucial. Por isso, todo o alarido em
torno da greve de Palmela reflete uma perspetiva tendenciosa sobre as transformações
no mercado de trabalho, na qual a queda da densidade sindical se integra.
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