sexta-feira, 15 de setembro de 2017

UMA PRECIOSIDADE





O concerto de Krystian Zimerman num dos primeiros anos de euforia de usufruição da Casa da Música, mais propriamente em março de 2006, talvez tenha sido um dos meus momentos mais marcantes como espectador sensorial de concertos, numa busca de que os sentidos compensem a iliteracia musical que bem amargo. O pianista polaco sempre constituiu uma peça rara do “circuito” dos grandes performers. Ligado quase umbilicalmente ao seu piano, construído em cooperação estreita com a Steinway, Zymerman é um preciosista relativamente ao instrumento de trabalho, fazendo-se acompanhar em praticamente todas as vezes do seu próprio piano.

Lembro-me que, na altura, alguma imprensa que registou a vinda de Zimerman à Casa da Música se referiu abundantemente aos traços míticos do pianista e isso fez-se sentir na sala, preparada para qualquer coisa de diferente. O Público registou antecipadamente a vinda de Zimerman nesses termos (link aqui). Gostaria de ouvir a gravação dessa noite na Suggia, que envolveu Mozart, Ravel e Chopin. Incomodado por algum comportamento da audiência que terá interpretado como uma possível gravação ou talvez traído por uma iluminação menos amigável, recordo-me que interrompeu a prestação, vociferou alguma coisa que não se percebeu e retomou Chopin como nunca tinha ouvido.

A edição recentíssima na Deutsche Gramophone das sonatas D 959 e D 960 de Schubert é uma preciosidade e imagino o ambiente do Kashiwasaki City Performing Arts Centre no Japão, que tem a particularidade de ter sido reconstruído após o terrível terramoto de 2007. Como não podia deixar de ser, o auditório em que a gravação foi concretizada tem segundo Zimerman características acústicas ímpares, ou seja, da meticulosidade do piano com um teclado concebido pelo próprio Zimerman à acústica do auditório temos o que seria concebível.

Por mim, basta-me usufruir da tecnologia numa tarde distendida de sexta feira. Sobretudo a D 960  torna tudo o resto indiferente.

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