(Todas as manhãs a newsletter Europe Express do Financial Times, inserida na assinatura digital standard deste jornal, coloca-me a par do ambiente institucional, de eventos, de decisões e de ruído que vão emergindo na capital europeia. Hoje, o clima que transparece dos pronunciamentos dos jornalistas Henry Foy que chefia o departamento do FT em Bruxelas e de Laura Dubois que edita a referida newsletter anuncia tempos de agonia para a União Europeia. É consequência direta e imediata da tal longa reunião telefónica entre Trump e Putin, abrindo informalmente o que se pressupõe ser o início de negociações sobre a Ucrânia, obviamente com a ausência do país ocupado e colocando completamente ao lado a União dessas conversas preliminares ou talvez mais do que isso. O que é mais absurdo neste ambiente fúnebre que transparece da crónica dos jornalistas do FT é que tudo se trata de uma simples crónica anunciada, pois o afastamento da União do real poder de decisão sobre a evolução do conflito é coisa que estava na leitura dos astros há já algum tempo. Como referi ontem no meu post, o responsável pela Defesa americana Pete Hegseth tinha ontem, em Bruxelas, claramente enunciado várias coisas: que seria irrealista admitir que a Ucrânia iria recuperar todo o seu território ocupado, que nem por sombras a presença de forças militares americanas no território após a trégua seria possível e que a Ucrânia poderia tirar os cavalinhos da chuva quanto a uma possível integração na NATO.)
Com a longa conversa de ontem entre Trump e Putin, fica a pairar no ar a ideia de que os países da União irão ter de alocar a presença de forças militares em território ucraniano no âmbito de uma negociação da qual serão afastados, isto já para não falar nos encargos óbvios com uma eventual recuperação da devastação infraestrutural e obviamente no quadro de uma situação que reforçará a vulnerabilidade europeia face aos humores expansionistas de Putin. Porque, em boa verdade, quem acredita que nas conversações entre Trump e Putin as questões da segurança europeia sejam salvaguardadas? Como se anunciava no horizonte, temos aqui a mais irredutível e trágica demonstração da irrelevância europeia, que assume o estatuto de derrota dos que falaram manso e fino quanto aos novos rumos da diplomacia internacional, ou seja, os que sempre fizeram de Trump uma figura excêntrica, mas mais cândida do que os maus espíritos apregoavam.
Conclui-se, assim, que as autoridades europeias andaram a falar para o vento e para os peixinhos quando apregoavam que teriam de fazer obrigatoriamente parte de qualquer negociação de tréguas e de paz. E para adensar a humilhação europeia corre o ruído de que Trump terá sugerido que a Arábia saudita poderia ser a entidade de intermediação nas negociações.
Torna-se para mim inevitável concluir que os críticos dos avanços da integração europeia, não apenas alicerçada na ideia de uma Europa económica do mercado único, que expunham então a salvífica ideia de que as realidades nacionais teriam de ser protegidas e conservadas estarão agora num beco sem saída. Alguém ainda acreditará que uma União Europeia restringida ao simples somatório das realidades nacionais poderá algum dia constituir um bloco politicamente respeitável? O que o mito das realidades nacionais e o ressurgimento do nacionalismo na Europa conseguiram produzir foi a emergência de um outro bloco que ameaça por dentro a democracia europeia – Make Europe Great Again, que não são mais do que cavalos de Troia multiplicados pela extrema-direita para transformar a democracia em exceção e não na regra.
O ambiente em Bruxelas deve ser fúnebre. A data das exéquias é indeterminada.
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