sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

JÁ CHEGA DE TANTA INDIFERENÇA!

 


(Posso admitir que a minha perceção de que os Democratas americanos estão paralisados e sem a mínima capacidade de resposta ao assalto à democracia americana que Trump e os seus apaniguados da alta finança e do high-tech estão a consumar é fruto da distância e da consequente incapacidade de perceber o momento. Admito, mas tenho dúvidas, porque o silêncio é demasiado ensurdecedor. Mas já não tenho qualquer dúvida que, com a exceção do momento de lucidez de Marcelo Rebelo de Sousa, a classe política portuguesa está profundamente ao lado de ter uma compreensão correta da mudança de paradigma em que o enquadramento estratégico da Europa, incluindo a sua participação na NATO, está hoje mergulhado. A classe política portuguesa está hoje manietada e absorvida pelas guerras de alecrim e manjerona em torno da empresa imobiliária, ou o lá que seja, de Luís Montenegro e cedeu como patinho ingénuo à manobra de diversão do Chega. Nada mais preocupa a classe política portuguesa, incluindo os membros mais destacados do governo, incapaz de entender que tudo mudou e que na conjuntura dos quatro anos de governação Trump, e sabe-se lá, o que lhe sucederá, a Europa deixou de ter como aliado os EUA, a partir do momento em que se concretiza o seu alinhamento com Putin na marginalização da Europa. A diplomacia de papel é hoje grotesca, assistindo impávidos e serenos à partilha descarada da Ucrânia. Tenho-me recordado de um célebre slogan do PREC – “ as p**** ao poder porque os filhos já lá estão”.)

Creio que na semana passada, assistimos incrédulos a um daqueles momentos que ficarão na história. O Vice-Presidente americano J.D. Vance veio em Munique afirmar com desplante que a Europa tem internamente um grave problema de liberdade de informação e de expressão, desafiando-a a desmontar qualquer bloqueio informativo à extrema-direita europeia, afirmando-se sem qualquer prurido como o grande defensor dessa liberdade para os que querem precisamente destruir essa liberdade em nome de um conjunto de interesses dos mais poderosos. A Europa seria livre quando abrisse caminho a todos os Cavalos de Troia já nela instalados, colocando uma passadeira vermelha e apelativa aos que a querem destruir por dentro.

Como é óbvio e compreensível, isto significa que, sem sabermos por quanto tempo, os EUA deixam de ser um aliado da Europa. A própria NATO está condenada às ruas da mais cruel amargura, como é possível concebê-la como uma entidade largamente dependente de um país como os EUA que se alia deliberadamente a Putin e à Federação Russa para comemorar o festim da partilha da Ucrânia. Num ápice tudo se desmorona, sendo a Europa obrigada a fazer em pouco tempo aquilo que a sua lassidão foi sistematicamente adiando.
Gostaria de ser mosca para assistir aos debates políticos em algumas forças como por exemplo o PCP. Sempre compreensivos para as narrativas fantasiosas de Putin sobre a Ucrânia e ferozes adversários do imperialismo americano, gostaria hoje muito de saber o que é que pensa a ortodoxia do PCP quanto a esta aproximação tática e estratégica entre os EUA de Trump e Putin.

A partir de Pequim e da sua mais consistente sabedoria do tempo longo, a China deve estar a esfregar as mãos com a oportunidade de ouro criada pelo desmantelamento da política industrial americana que a equipa de Trump está a colocar em prática, abrindo inexoravelmente caminho à superioridade tecnológica chinesa em vários domínios em que os EUA ensaiavam alguma recuperação a partir da alteração das cadeias de valor globais.

Os tempos estão favoráveis a que o totalitarismo de informação e tecnológico sufragado em eleições se imponha como alternativa às democracias liberais. E o que é verdadeiramente impressionante é que tudo isto acontece com os EUA a conservarem o seu papel de destino principal do investimento direto estrangeiro como o gráfico acima o evidencia com toda a clareza.

A cada dia tudo nos surpreende e creio que não ficaremos por aqui.

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